O tempo lá em casa era das vacas magras. Havíamos mudado fazia pouco tempo para aquela cidade grande. Os novos costumes exigiam cuidados e sacrifícios de todos nós, os sete filhos de meus pais. O mais novo nasceria no final daquele mesmo ano de nossa chegada. E ainda havia outro que completaria um ano no mesmo mês do nascimento do esperado. Eu estava com seis anos e já havia sido matriculada no Grupo Escolar assim como minha irmã mais velha um ano que eu. Nós duas éramos de julho. Eu mais gordinha e clara e ela magrinha e morena.
quarta-feira, 30 de março de 2016
quinta-feira, 24 de março de 2016
terça-feira, 15 de março de 2016
Crônica: Depois de ontem
Nunca entendi porque éramos tão pobres. Meu pai sempre
trabalhara muito. Era um homem por demais inteligente e se virava quando o
assunto era política. Foi assessor e secretário de políticos famosos da região.
Foi funcionário público estadual de carreira da administração fazendária do
estado de Minas Gerais. Gostava do que fazia. Sempre nos contava como era
procurado pelo povo para ajudar-lhes naquilo que eram suas atribuições, ou
seja, guias e documentos fiscais.
quinta-feira, 3 de março de 2016
A menina e a asma
As outras, a irmã e as primas, tomaram distância e nem ciência deram da que ficou para trás. A brincadeira não esperava por quem não conseguia correr. Perdeu. Tidinha parou. Estava muito cansada. Faltava-lhe o ar. Olhou em volta e constatou que estava sozinha e por demais longe de casa. Quis chorar mas não se permitiu. Haveria de ter gente de casa procurando por ela. Sentou no nada do barranco. Esperou. Gente alguma apareceu pra desgosto da menina.
O pai decerto estava viajando pras bandas da capital. Trabalho dele motorista daquela linda jardineira. A mãe. Ela nem sabia o que era feito da mãe. Felício e João deviam de estar pegando mangas. Era o tempo delas. Ou estariam aproveitando a ausência do pai e teriam fugido para as margens daquele rio tão próximo. Nadariam até dar rugas nos dedos.
Tidinha queria ser logo encontrada. Pensava que a mãe, sumida que vivia, aparecesse para o caso de encontrá-la. Será que a menina fazia faltar o ar nos seus pulmões para fazer a mãe aparecer? Era o que ela pensava. A mãe iria logo chegar e lhe carregaria no colo. Então ela encostaria a cabeça em seu peito e sentiria o cheiro do seu corpo.
Mas a mãe não apareceu. Só nos seus quereres. A barriga requereu atenção de fome. Onde estariam Zefa e as primas que nem deram falta dela? A cabeça coçou. Deve de ser os piolhos que não morreram com aquele pó branco fedorento. O ar reapareceu devagarinho e com ele veio a vontade de chorar. E ela chorou. Estava sozinha no meio do caminho da casa do Sô Mundinho. Lá muito depois da ponte do rio.
Por que a mãe não aparecia? Será que de novo estava trancada dentro do quarto? Via tão pouco a mãe que nem lembrava do seu jeito. Agora as lágrimas embaçaram as lentes dos óculos fundo de garrafa. Foi a tia que viu que a menina não enxergava direito e mandou providenciar a consulta com oculista. O pai levou em um dia de trabalho. A menina viajou mais passando mal que tudo. A cabeça lhe doía e os bofes saiam tudo pra fora. Carecia de mais roupas para trocar antes de ver o doutor.
Tidinha lembrava de tudo naquele momento de sozinha ficar. A roupa branca do médico e seu pouco conversar. Esclareceu a dor de cabeça sentida. Era tudo devido os olhos que não viravam direito. Olhava só para frente que nem burro de carga com viseira para não ver as belezas dos capins verdinhos ao lado.
Queria já ser menina grande sem lentidão de correr. E não passava nem uma alma protegida dos céus para lhe dar a mão e levar de volta para casa. Parou de chorar. Escutou os sinos da igreja. Era hora do Angelus, como dizia seu pai. A mãe falava que não gostava daquela hora. Dizia que já não era dia e a noite ainda não tinha chegado e amedrontava falando que era a hora do lobo. Tidinha nem tinha medo de lobos. Mas tinha muito medo das cobras cascáveis e dos urutus. Por ali tinha muitas delas que eles pegavam e mandavam para fazer soro. De repente esqueceu das cobras e levantou os olhos por detrás das lentes verdes. Pareceu que ficara ali toda uma tarde.
Então lhe apareceu a irmã esperta e corredeira. Conduziu Tidinha de volta para casa. A mãe nem tinha dado fé de seu sumiço. E quem lhe daria o banho? Foi até a cozinha. Comeu um pedaço do bolo trazido pela tia. Rumou para seu quarto. Deitou na cama pequena e estreita. Dormiu logo.
E, naquela noite, sonhou que ganhara asas e voou pelas estradas. Agora enxergava tudo. Sem aqueles óculos verdes feios. Certificou que estava deveras só no mundo. Carecia de voar...voar.
Deveria de buscar o ar e não se deixar morrer sufocada por aquilo que lhe faltava.
Observação: Caso queiram fazer algum comentário não esqueçam de de se identificarem.
25/01/2016
Assinar:
Postagens (Atom)