segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Postagem do Facebook, "MANHA DO DIA 20 DE OUTUBRO DE 2022"



Acordei no meio da noite com o delicioso barulho das chuvas caindo no meu quintal. Escutar o farfalhar das folhas dos imensos ipês foi meu melhor calmante. A noite estava fresca e convidativa à calmaria. Meus ouvidos ensurdecidos me presentearam com os sons das águas sobre minha casa.

Foi preciso aliviar as tensões das últimas semanas. A noite cheirando a terra molhada e a flores da primavera, foram revigorantes. Às águas da chuva se misturaram os suores das caminhadas, das carreatas, dos trabalhos de “virar um voto”, das poeiras do mineiro grudadas na pele, das palavras mal ditas pelos inescrupulosos adversários.

Enfim acordei leve, fresca, renovada e limpa.

Abri as janelas. Constatei então que não havia terra molhada. Não choveu a noite. Mas choveu muito nos meus sonhos.

Enfim meus sonhos me trouxeram de volta os sons e cheiros da terra e dos céus.

Um café coado diretamente na xícara. Pão com queijo e um pedaço de mamão. “Hoje retomarei minhas leituras - ‘As mil e uma noites’ das arábias ainda não passaram de cem histórias. Meus cursos de literatura russa e pensamento crítico continuam parados. Vou retoma-los a partir de agora”. Assim decidi em pensamento. Doce ilusão.

Naquele exato momento me veio a lembrança do meu pai falecido há exatos sete anos. Ele foi um pai alegre, presente, inteligente, divertido e um homem bem à frente de seu tempo. Tentou inutilmente me ensinar a tal prova dos nove na matemática. Entendia um pouco de latim, francês e amava nos contar as histórias do Brasil. Contava, com orgulho, que estudara até a quarta série do ensino primário. Amava a minha mãe e fazia tudo por ela. Enquanto avô foi pura doçura.

Até então nunca havia entendido as contradições políticas do meu pai. Ele amava seu povo. Foi eleito prefeito na nossa pequenina cidade da Zona da Mata Mineira, recém criada, nos anos cinquenta. Meu pai sempre respeitou e reconheceu a coragem, a força, a sabedoria e o peso dos seus adversários políticos. Entretanto, como artista que era, não conseguiu governar com a razão que o cargo exigia. Renunciou à governança.

Respeitou e admirou o “grande milagre brasileiro” dos tempos sombrios da ditadura. Vivi minha infância e toda minha adolescência durante aquele tempo. Talvez eu não tivesse a consciência e o entendimento políticos e sociais que tenho não fossem um amigo de adolescência com suas indicações de leituras socialistas e meus estudos numa universidade pública federal. A isto se juntaram os inúmeros trabalhos enquanto médica em serviços públicos.

Percebo hoje que não havia como não cair nas seduções das TVs da época que mostravam grandes e maravilhosas realizações dos generais presidentes apresentadas em noites de sextas-feiras e por todos os finais de semana. Obviamente que jamais falavam dos jovens “suicidados” nos porões do regime, dos desaparecidos, das covas rasas, das perversões com mulheres e homens.

Com isso quero dizer que lamento o fato de tantos familiares, colegas e amigos, estarem seduzidos pelo que há de pior na classe política brasileira. Entristeço por aqueles que não tiveram ou que não tenham capacidade de entendimento daquilo por trás da extrema direita no Brasil e no mundo. Entretanto, para todos aqueles que sabem do que se trata a perversidade do atual presidente e, mesmo assim, optaram por ele, só lamento. Estamos irremediavelmente de lados opostos.

Sou da vida, da alegria, da doçura, das leituras, das artes e dos amigos e amigas, sou também irremediavelmente do lado esquerdo do coração.

Voto Lula presidente do Brasil.

domingo, 23 de outubro de 2022

Postagem do Facebook, 23/10/2022






Carta para meu Neto

Mário Campos, domingo, 23 de outubro de 2022

Boa noite para você daí e

bom dia para nós daqui

Estou com muitas saudades de vocês. Ainda ontem sua Tia descobriu as folhas que você escreveu pra mim. “Vovó é bufufuda”.

Ainda posso ver seus sorrisos quando lhe respondia: “Bufufuda é sua avó. Mãe do seu pai”.

Há um mês vocês se foram para longe de nós e daqui alguns dias você fará sete anos.

Lembro do dia do seu nascimento. Por acaso do destino aquele dia foi meu último plantão antes da minha aposentadoria. Eu estava feliz demais com sua chegada. Quando você me viu pela primeira vez, foi logo abrindo os olhinhos e pude ver que eles tinham a mesma cor que os meus. Estava feita nossa apresentação. Depois foi só alegrias com nosso convívio.

Agora você está tão longe e eu estou com muitas saudades. Mas feliz por saber que estão descobrindo um país belo, com oportunidades iguais, que está conhecendo novos amigos e aprendendo muitas coisas legais.

Mas aqui no Brasil as coisas não estão legais. O presidente do país não ajudou o povo durante a pandemia, ele debochou dos doentes sem ar para respirar, ele não gosta das pessoas pobres, não cuida das pessoas e agride todo mundo que não gosta dele. Aqui a comida está muito cara e várias famílias compram ossos nos açougues e catam restos de comidas nos lixos.

Meu netinho, estamos muito tristes com toda essa situação. Sei que você compreende o que estou falando pois acompanhei bem de perto a educação que seus pais lhe deram. Sei também que você sabe que o motivo de terem ido embora do Brasil foi tudo isto que está acontecendo conosco. Ai sua mãe fará um excelente curso e seu pai conseguirá um bom emprego. Eu continuarei chorando de saudades mas lutando por aquilo que acredito. E eu acredito na vitória do ex- presidente Lula no próximo dia 30. Será seu presente de aniversário adiantado.

Fiquei sabendo sobre sua escola e de tudo de legal que ela tem. Achei muito engraçado os nomes dos parques daí. Aproveite bastante. Faça muitos amigos e os convide para conhecer o Brasil, nossas belezas naturais e nosso povo alegre.

Coloque a toalha do Lula na janela do seu quarto, tire uma foto e envie para mim. Ok?

Eu te amo muito e não sou bufufuda!!! Porque bufufuda é a sua avó, mãe do seu pai.

Muitos abraços e beijos para você, sua mamãe e seu papai.

Sua vovó Zarinha Rivelli










segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Postagens do Facebook - 17/10/2022

 Sobre galinhas e rachadinhas

Enquanto médica e psiquiatra não poderia deixar de apontar a atuação do ex-presidente Lula, ontem, no debate da TV Bandeirantes.

Lula demonstrou, mais uma vez, sua humanidade ao não ficar impassível mediante as provocações e ao escárnio dirigidas a ele pelo outro candidato. Lula ficou nervoso e inquieto ao lado do seu adversário.

Por outro lado, Bolsonaro sendo um sujeito débil com todas as características que tal adjetivo lhe confere, manteve-se em posição militar com seus risinhos estapafúrdios. Bolsonaro é portador de poucas palavras e de muita ignorância, é portador de instintos animalescos como a zoofilia e a pedofilia (como ele próprio declarou), é portador de tantas outras atitudes inadequadas ao ser humano e, ainda mais, ao cargo que ocupa. Portanto só lhe restam a fala desajeitada, o corpo enrijecido, a falta de expressões faciais, o amor às mentiras, ou seja, a mitomania.

Lamentável e compreensível que tais disparates lhe tragam tantos seguidores por aquilo que chamamos de identificação ao líder.

Finalizando quero deixar claro que estarei sempre ao lado daquele que luta por justiça social, pela soberania do país, ao lado daquele que busca educação de qualidade para todos, ao lado daquele que implantou o SUS enquanto o maior programa político gratuito de saúde do planeta e por tantos outros feitos...

Eu sou LULA.

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Crônica: Nome de Santa Madroeira

 


Brás Pires, meu amor, 7 de outubro de 2022


A casa, sempre refeita nova, me acolheu mais uma vez com a mesma delicadeza de outras chegadas.

A tarde estava suave e fresca. Meu olhar foi convocado até a enorme janela do quarto que me foi oferecido na casa. Em poucos minutos a noite iria engolir o dia. Naquele exato momento meu coração disparou. - Nessas horas preciso escrever - Prontamente minha cunhada atendeu ao meu pedido me trazendo folhas em branco. Não poderia perder a inspiração.

Apaguei as luzes do quarto. Queria ver a escuridão.

Lá embaixo o campo de futebol do Independência. A grama estaria verdejante pela bênção das primeiras chuvas. Mais adiante o Rio Xopotó serpenteando duas extensões de terra revoltas. À tarde eu havia ficado ali, observando o trabalho dos agricultores com seus tratores que mais pareciam marujos navegando e singrando a terra com seu vermelho.

Quando a escuridão tomou conta de tudo, debrucei no peitoril da janela. Nem fora preciso fechar os olhos. Inspirei fundo e deixei o aroma da noite penetrar dentro de mim. Cheiro de terra molhada revolta, cheiro de grama e outros cheiros inebriantes de mata no entorno.

Talvez um vinho tinto colorisse a noite. Talvez a noite me deixasse penetrar nos seus segredos mais íntimos e escandalosos.

Bendita noite que me deixou ver algumas luzes do outro lado do Rio. Lá estava a charmosa Várzea, uma extensa região plana, acima da serpente d'água. Havia ido lá pela manhã. Deparei com flores na porta de entrada e, dentro da casa, uma mulher guerreira que não havia sucumbido aos acasos que a vida lhe trouxera. E ganhei abraços.

Voltei para minha janela e olhei à minha direita. Um muro que à tarde havia sido palco das lagartixas imóveis ao sol esperando pelos distraídos insetos.

À minha esquerda, na escuridão da noite, vejo cenas da amiga de infância numa cadeira de rodas. Adoeceu bem pequenina e não andou mais. Tinha nome de anjo. Muitas vezes eu saía de casa para brincarmos juntas. Amava aquele percurso. Será que foi numa dessas vezes que teria encontrado o Leite, mais uma vez, bêbado e esbravejando sobre a ponte de braúnas enegrecidas? Não lembro o que fiz. Certamente havia pensado que morreria naquele momento.

Eu e minha amiga falávamos de amores. Éramos duas adolescentes e nem sabíamos o que era aquilo. Mas falávamos de amor.

Ainda na janela continuava a sentir o cheiro da terra remexida que remexia meu coração. Para onde teriam ido aqueles amores?

De repente as curvas do meu Rio dos Cipós Amarelos trouxe de volta as dores concretas até então trancadas dentro de mim. Cortou-me na carne as lembranças daquelas duas mortes.

A morte de adolescente deveria ser proibida. É estupidez. Assim como a morte de pais jovens que deixam filhos órfãos.

Duas mortes ali bem perto de mim. E elas me amadureceram antes do tempo.

Constatei que os dois tratores abriram a terra para brotar as sementes e, à noite, dois tratores passados encheram meus olhos de água.

E, nesses dias de festas à madroeira, Nossa Senhora do Rosário, me rendi às tradições. Saí pela pequena cidade revisitando meu passado. Reconheci cheiros do passado. Ouvi palavras do passado. Abracei meu passado. Fazia-se preciso reviver meu passado para entender meu agora.

Nessa noite de aromas molhados me encontrei no meu nome de santa:

                           Maria do Rosário

(2 
Estrada, às margens do Rio Xopotó, para a fazenda São José do Porto)

                                   
                                           

(3)
Flores no chão da árvore no meio da estrada.



(4)
"Que é árvore é esta que exala tanto perfume?", foi minha pergunta a um motociclista que passava por ali e parou ao meu pedido.
_ "É a Esperta. O leite dela cura furúnculos"
E me apaixonei pela Esperta




(5)

Encruzilhada. À direita para a Ribeirão de Santo Antônio. E, à esquerda vai para Cipotânea.





(6)
E eis a belíssima Gameleira. Ela reina sozinha e gigante no meio de uma várzea, na estrada para Cipotânea.


(7)
No entroncamento da estrada está a casa do meu Tio João. Ali estava a Fazenda São José do Porto.



(8)
E a Congada vai em direção à igreja de N. Sra do Rosário para saudar e protegê-la.


Agradecimentos:
Nilza Maria Teixeira Nogueira
Maria da Glória Rivelli de Oliveira.

Fotografia: 
- (1)pintura sobre tela da Fazenda São José do Porto.