quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Crônica: Um velho menino





Um dia teve que fazer escolhas. Não titubeou. Escolheu com o coração. O preço, qualquer que fosse a opção, seria alto demais. Assim o foi. Mesmo muito jovem pagou seu valor. Não fossem as fanfarrices com a vida talvez tivesse sucumbido. A paixão pelo Clube Atlético Mineiro e pelas partidas de futebol de várzea foram os esteios por onde suas pernas se apoiaram, com certeza.

Doce feito ele só aprendeu muito bem as terríveis diabruras ensinadas pelo padrinho-tio Padre. Acordar os sobrinhos, ainda nas madrugadas, contar piadas, fazer mágicas com o baralho, jogar buraco, pescar, colecionar cachaças, tem sido seus prazeres.

Quando menino, por um tempo, carregava um balaio de bambu maior que ele. Vendia pães nas madrugadas pelas ruas do nosso bairro.

Depois veio o seminário em Barbacena. Um santo aquele menino. Cruz credo! Acho que a mãe pensava que Deus pudesse colocar um pouco de juízo na cabeça do filho. O menino era “de morte”. Sempre dava um jeito de colocar a culpa de suas presepadas em outro irmão, primo ou vizinho. Era mesmo “de morte” aquele menino.

Mas o menino era muito inteligente. Ensinou-me aritmética, língua pátria, história, geografia e ciências para que eu fizesse a admissão sem precisar cursar mais um ano antes de entrar no ginásio. Passei direto para o Estadual.

Quando esse menino foi ficando jovem,  ganhou o apelido de "caxotinho de rapadura". O segredo do apelido ele trancou dentro desse caxote melado e o fechou a sete chaves. Ainda hoje fica com a face ruborizada se alguém toca nesse caxotinho. 

Hoje, fazendo setenta anos, orgulhoso dos filhos e netos, amante de sua sempre namorada-esposa-avó, ele está lá. Ilhado, envolto pela Represa de Três Marias, onde criou raízes bem longe de nós.

Com fubá jogado ao chão, atualmente, ele recebe canarinhos e cardeais no seu terreiro. Planta rosas do deserto e continua acordando nas madrugadas.

Amo-te meu irmão .

Observação: Na foto acima estão três gerações de Nelsons. Meu pai, meu irmão e o filho deste, meu sobrinho.

domingo, 2 de fevereiro de 2025

Poesia: Um amor adormecido


Ao redor

o piar dos passarinhos

o farfalhar das folhas

o cheiro da terra molhada

Sobre a mesa o café fumegava

Uma mensagem chamou atenção

“Bom dia meu amor adormecido”

Ela abriu os olhos

Acordou sem as rugas do tempo

Sorriu sozinha

Virou menina outra vez



02/02/02025

Fotografia: Lisboa (Portugal), gentilmente cedida por um amigo