quarta-feira, 29 de julho de 2015

CRÔNICA - CAMINHOS DE VOLTA



A desculpa para irmos à minha querida Brás Pires foi a XXIII Festa da Batata no último final de semana deste mês. Com direito a shows, comidas gostosas, artesanatos locais, cafés na padaria pelas madrugadas, encontros políticos etc. Mas minha ida até aquela cidadezinha da Zona da Mata Mineira tinha outros motivos. Ver e conversar com as pessoas que falam a língua da minha infância. Abraçar minhas queridas tias tão velhinhas e cheias de histórias. Viajar pelas estranhas das minhas lembranças. E lá fui eu com toda essa vontade.

Não acreditei quando minha cunhada paulista chegou na casa de minha outra cunhada me intimando para a caminhada combinada na noite anterior. O percurso já havia sido definido, uma légua, que meu irmão insistiu que seriam apenas cinco quilômetros. Eu não havia me preparado para tal, mesmo assim aceitei de pronto o convite e fui do jeito que me fora possível. Meu coração, desde o primeiro momento já descompassara no peito. Eu haveria de fazer aquele trajeto tantas vezes feitos na minha infância e adolescência. E lá fomos nós três pelas estradas empoeiradas margeando nosso saudoso Rio Xopotó.

Logo nos primeiros passos nos cumprimentou uma mulher, provavelmente  moradora da região, que dirigiu-se a mim perguntando qual das Marias era eu, referindo-se às três filhas de meus pais, tão conhecidos por lá. Reconhecimentos feitos, sorrisos largos e continuamos nosso rumo. Alguns carros passavam por nós em velocidade baixa para evitar o levantar das poeiras. Outros esqueciam desse respeito. Entretanto a poeira da estrada fazia parte de tudo.

Chegamos no trecho do belíssimo e enorme Pau D'alho. Logo ali onde, na margem esquerda, o barranco minava muita água que descia procurando encontrar o rio. e era naquela bica improvisada que diariamente nosso personagem mais ilustre, Chico Adriano, colhia sua água, engarrafava e a benzia. Voltava para a cidade com seu precioso líquido a rezar e benzer quem assim o desejasse.

E o Rio continuava calmo e nos beijando na margem direita, descendo em sua mansidão da época das secas. 

Mais um pouco e chegamos na entrada da casa do grande amigo de nosso pai, Sr João Monteiro, falecido recentemente. Soubemos que Donana estava ali, havia voltado para seu lugar. Ali, certamente teria a eterna companhia de seu  marido.

Lembramos que naquele trecho havia muita água descendo pelos barrancos e formando maravilhosos riachos no meio do caminho. Acho que apesar de só termos andado um quilometro de chão, já havíamos passado por dezenas de lembranças.

Logo mais a frente ficava a gigantesca Fazenda dos Vilela, que embora já demolida, mantinha-se intacta dentro de nós. Nos fundos dela tinham várias jabuticabeiras a escurecer todo um lado do terreno. Hoje casas novas em seu lugar. Sempre pensava nos escravos que viveram naquela região e sua histórias de amores.

Meu joelho direito começou a doer. Esquecei dele e continuei as andanças.

Alda Lúcia, minha bela e companheira cunhada, estava a caráter com suas roupas e mochila. Meu irmão, bonitão e também com dores articulares, era só risos de saudades.

Chegamos á casa do ex-prefeito e também amigo de meu pai, Sr Raimundo Vidal, pai de várias amigas e de um amor oculto. Ali, para mim era a metade do caminho onde eu sempre parava para o café com quitandas de Dona Jojove. Será que ela estava lá? Tive vergonha e não parei. Criança não tem vergonha. Bobeira minha. Eu seria recebida com o mesmo carinho.

E chegamos na entrada da Mata do Porto. Barrancos na esquerda e despenhadeiros na direita. O Rio lá embaixo a nos acompanhar , em sentido contrário. Ele desce para atravessar a cidade. Contamos histórias de macacos e jaguatiricas que povoavam aquela região. As árvores eram tão altas e a mata tão densa que se encontravam no alto. Deixavam a estrada escura e não permitiam a entrada dos raios solares.

Alda Lúcia nem se medrou com nossas lembranças. Só perguntava se tinha outros morros porque Zé Eugênio jurara que toda a estrada era plana. E ela acreditou no seu marido. Paramos para ver a reconstrução da pinguela mas não tivemos coragem de atravessa-la pois o guarda-corpo era muito baixo e poderíamos perder o controle no balanço da travessia. Apenas fotografamos como se realmente a tivéssemos atravessado.

Mais um morro ensolarado. Aproxima um carro e nos oferece carona. Meu sobrinho e colega de profissão, Ramiro, e sua também bela esposa Graziela. Não aceitamos a carona. Eles desceram e se juntaram a nós para mais fotos e casos pitorescos daquele lugar. 

Agora faltava a parte mais difícil: morros que iam deixando meu Rio lá embaixo a me olhar com suas curvas.

Após o último morro veríamos a várzea com a Fazenda São José do Porto lá nos fundos onde a planície se encosta na mata densa de novo. Mata Atlântica, cheia de belezas e mistérios. À noite os bichos faziam a festa e, na madrugada, os pássaros cantavam seus cantos de dor e alegria. E muitos sons eram escutados vindos daquelas bandas.

Então chegamos no nosso destino. Os cachorros fizeram festa com a nossa chegada. Educados e mansos. O carro do meu sobrinho já estava por lá. Tio João nos recebeu com sua costumeira pose de homem do campo e nos garantiu que o ganso não correira atrás de nós. Não acreditei mas enfrentei a ave que partiu em disparada atrás de mim e de minha cunhada. Após o aperto uma água fresca da bica e os risos fartos de corpos maduros e de almas de crianças.

O fogão de lenha estava apagado, a casa vazia, mas as janelas abertas deixavam o sol entrar. A saudade da minha Tia Rita trouxe lágrimas para meus olhos. E meu olhar ficou perdido dentro de mim.

Aceitamos a carona para a volta. E voltamos com a certeza de que continuaremos vivos para outras caminhadas.


29/07/2015

terça-feira, 14 de julho de 2015

OPOSTOS



                                       OPOSTOS


             Ontem adormeci com o corpo pesado 

        Mas esvaziado de mim.

        Acordei hoje com a leveza do meu corpo 

        E o peso de um amor sem fim.



          13/06/2015

quarta-feira, 8 de julho de 2015

CONTO INFANTIL 2 - Um cahorro muito valente



                                           
   Um dia a dona daquela casinha percebeu que havia um outro cachorro andando pelo terreiro em torno dali. Mas toda vez que ela aproximava, o tal do cachorro fugia em disparada. Ela, então, começou a colocar ração e água bem longe da casa para que ele fosse acostumando com ela e com aquele lugar.

 Já havia Duquesa, uma cachorra grande que chegou e acomodou-se sob as árvores.

  Um dia contaram que Duquesa ia ter filhotinhos. A cachorra já havia cavado um buraco na terra como se fosse um tatu onde teria seus filhotinhos. Assim eles estariam protegidos do sol, da chuva e ficariam quentinhos debaixo da terra. Foi então que o outro cachorro chegou. Será que ele era o pai dos cachorrinhos que iriam nascer?

  Duquesa já tinha o apelido de Branquela embora ficasse sempre da cor de terra, mas parecia uma madame de tanta educação e gentileza. Ela mandava no terreno e ficava sempre empertigada que nem uma rainha. O outro cachorro que aparecera, a respeitava e vivia atrás dela.

  Dona Martinha foi aproximando devagarinho e sem pressa daquele novo companheiro da Duquesa. Passou a chamá-lo de Neguinho porque seu pelo brilhava de tão negro. Ele era muito bravo. Latia alto toda vez que alguém passava nas ruas.

  As pessoas da região não gostavam do barulho que ele fazia e tinham medo dele. Dona Martinha ficou sabendo que ele fora abandonado logo que nascera e vivia procurando comida e revirando as latas de lixo. Então por causa da bagunça que ele fazia, as pessoas gritavam com ele e o expulsava dos lugares. E ele também ficou com medo das pessoas.

  O tempo foi passando e Neguinho ficou morando no terreiro da casa de Dona Martinha. Ele ficava sempre do lado de Duquesa como se fosse seu marido.

  Mas um dia aconteceu uma triste história. Dona Martinha mandou os dois cachorros para o Pet Shop para serem lavados, vacinados e examinados pelo veterinário, que é o médico dos animais. Então o Neguinho pulou do carro e correu, e correu, e desapareceu. Todos foram procurá-lo. Ele sumiu no meio do mato. A noite chegou e foram avisar Dona Martinha que ficou sem saber o que fazer. No dia seguinte lá foi ela procurar o Neguinho. Pegou seu carro e foi para a outra cidade onde ele havia fugido, mas não o encontrou. Foi de novo no dia seguinte. Ela pensou que o Neguinho pudesse estar escondido no meio do mato por causa de seu medo das pessoas. Na certa ele ficava escondido durante o dia e saia a noite para procurar comida.

  Passou uma semana e nada de encontrar o cachorro.


 -" Mas ele é muito esperto, deve conseguir sobreviver por ai." Era assim que Dona Martinha pensava.

  Passou outra semana e ela ouviu muitas histórias de cachorros que voltavam para casa quando ficavam perdidos.

-"Mas ele fugiu em outra cidade.Como ele voltaria para cá?"
Era ela a pensar de novo.

 Uma amiga para lá de inteligente disse para Dona Martinha não ficar preocupada pois Neguinho iria começar uma nova vida na casa de outras pessoas.

 Duquesa entristeceu e já nem queria mais comer.

 Mas, numa madrugada, quando já fazia trinta dias do sumiço do Neguinho, a vizinha de Dona Martinha escutou um latido que mais parecia um choro de cachorro. Ela levantou e viu o Neguinho no portão de sua casa. Chamou sua amiga e foram receber aquele cachorro tão querido. Mas ele estava muito ferido e precisava do veterinário que fora avisado e logo viera para cuidar dos ferimentos.

  Neguinho tomou muitos remédios. Foi deixando que todos ajudassem no curativo diário das feridas e até deitava na grama esperando a limpeza e os remédios.

 Ele melhorou, engordou de novo, ficou com o pelo ainda mais brilhante e olhava para Dona Martinha como se agradecesse todo aquele carinho.

 Entretanto Dona Martinha ficou com a cabeça encafifada e não conseguia deixar de pensar: "como foi que o Neguinho encontrou o caminho de volta para casa?"


07/07/2015