sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Poesia: Prenhez




Eis-me a entardecer

Sobre meu cabelo
a lua derramou seu prateado

Minha pele ressequiu 
e coloriu como folhas de outono

A noite escureceu meus olhares

Rajadas de vento
agitaram minhas pernas

Palavras hesitantes habitam minha boca

Mas dentro de mim estronda um coração 
como chuvas do verão

Meu peito estufa 
como sementes prenhas na terra úmida da primavera

A serenidade veio cuidar de mim

Eis-me a brotar de novo.

28/12/2023

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Crônica: Dudu e eu num país distante

                              
   
Estou de volta à nossa amada Terra brasilis.

Meus primeiros dias naquele país insular gelado foram de deslumbramento pelo novo, foram de alegria por estar ao lado do meu neto e foram de
muitas surpresas. Dani e Francisco fizeram tudo para me deixar à vontade na casa deles e para me agradar também. Desde comprar roupas adequadas contra o vento cortante, procurar fubá nos mercados da Índia e da China para que eu fizesse nossa broa mineira, como programar várias viagens pela bela região sul da Ilha Sul. Devo confessar que demorei muito tempo para que me sentisse ali, do outro lado do planeta. Às vezes eu andava pelos arredores da casa para me certificar de que eu estava de fato naquele país. Aos poucos fui me sentindo mais livre e confiante.

Pela manhã Dudu ia para sua espaçosa e moderna escola. Só voltava às quinze horas. Nesse tempo eu caminhava pelo Queens Park, numa das regiões mais belas da cidade, bem próxima à casa do meu filho.

-“Vem brincar comigo vovó!”, foi a frase que mais ouvi, entre outras, nestes noventa dias. Ainda tenho comigo a sonoridade de muitas dessas frases ditas por Dudu. Eu sentava ao lado dele, no chão sobre o carpete. Por ali ficava mexendo nos bonequinhos do lego sem saber como brincar com aqueles homenzinhos articulados. Dudu pegava peças daqui e dali e, num minuto, construía naves espaciais muito superiores em engenhosidade aeroespacial do que aquelas feitas pela NASA. Eram as naves do Star Wars com seus generais, seus clones, droids e aqueles povos esquisitos de outras galáxias.

-“Não vovó, você está voando com a nave ao contrário” era ele corrigindo o sentido errado das naves voando pelo universo.

Outras vezes me chamava para jogar videogame e eu nem sabia pegar nos controles (ou manetes?).

-“Esse sou eu vovó; você está tentando me matar! Nós somos amigos!”

Outra vez estávamos construindo não me lembro o quê quando lhe disse que havia encontrado uma peça legal na caixa de lego. Ele lança um breve olhar sobre a peça e me diz

­- “Vovó, isso aí é um gatinho!”

Algumas vezes ele me pedia para sentar ao lado dele para vê-lo jogar a tal Zelda e eu ficava sem entender aquelas várias tarefas. 

Hoje avalio o quanto ele foi educado, gentil e paciente com essa avó que nem sabia brincar com ele.

E nós dois líamos muito. Ele com seus livros em inglês e eu me divertindo com as loucuras de D. Quixote e seu fiel escudeiro, Sancho Pança, ainda no primeiro volume.

Ajudei pouco nos afazeres da casa. Vejo que poderia ter ajudado muito mais. Nunca fui boa dona de casa. Gosto mesmo é dos livros, das escritas e do meu neto.

Por duas manhãs de sexta-feira acordei bem mais cedo quando pude assistir às aulas de sociologia para estudantes carentes brasileiros, num cursinho popular para o ENEM. Francisco não sabe, mas aprendi muito nessas aulas e fiquei ainda mais orgulhosa ao vê-lo discutindo com os alunos deste lado de cá do mundo.

Dani é uma artista das mãos confeccionando roupas e bichinhos em crochê além da arquitetura com seus projetos incríveis. Devo a ela a construção da minha casa que, com competência e disponibilidade me ajudou em várias etapas. É também uma expert em informática e, muito mais importante que tudo isto, joga videogame com o Dudu. Eu ficava de longe, observando a alegria do Dudu, na disputa com a mãe no Mário Kart ou nas conquistas do Link em busca da princesa Zelda.

Vez por outra Francisco pedia ao Dudu e a mim para irmos ao supermercado, localizado a um quarteirão da casa deles. Dudu corria na minha frente e atravessava a avenida na faixa indicada, obviamente que lá a preferência é sempre do pedestre, como deveria ser em todos os lugares. Ele sempre sabia onde estava o que iríamos comprar, manipulava as balanças, mostrava os códigos de barra no visor, pagava com cartão de débito (lá não há cartões de crédito) ou em dinheiro e ainda recebia os trocos. Tudo sem precisar de trabalhadores. As máquinas fazem todos os trabalhos. Ficava impressionada com a desenvoltura do meu neto e sua segurança em tudo que fazia.

Dudu tem colegas de várias nacionalidades na escola. - Ficava imaginando como as professoras lidavam com os vários idiomas. Tenho pra mim que as crianças aprendem o inglês se divertindo nos espaços livres da escola, correndo de um lado para outro ou subindo na enorme árvore de corda elástica bem esticada e segura, a tal Spider web. Adorava ver a meninada escalando aquela árvore.

À noite Dudu pedia para dormir comigo e sempre queria que eu lhe contasse histórias, mas nenhuma que fosse “infantil”. Nós dois criamos versões diferentes da história dos Três Porquinhos bem antes deles mudarem do Brasil. Uma hora tinha uma “bola raio laser” iluminando a mata para evitar que o lobo mau pegasse os porquinhos. Outra vez era o macaquinho Dudu que ajudava os porquinhos a correrem do lobo. Mas lá, na Nova Zelândia, apareceu até uma vaca que tentava impedir a separação dos porquinhos da mamãe dona porca.

Contei-lhe quase todas as histórias do meu livro “Rosa nos Tempos” onde relato histórias da minha infância. 

Uma noite, quando eu pensava que ele já havia dormido, parei de contar a história e então ouvi “Vovó! Continua a história!”. Outras noites eu cantava e, numa dessas noites, continuei cantando mesmo quando ele já havia dormido. Ri sozinha percebendo que eu cantava para eu dormir.

Às vezes ele deitava comigo, mas logo desinteressava pelas histórias ou pelas minhas cantorias e ia para a cama dos pais.

Uma vez Dudu recebeu um amigo neozelandês para brincar com ele quando me colocou também na brincadeira. Harvey olhava espantado para uma velha dos cabelos de duas cores, que não sabia conversar com ele e que caía dura no chão ao ser baleada pelos inimigos, no caso, meu neto e ele. Até nossos diálogos se darem por sorrisos e olhares furtivos.

E numa manhã de outubro acordei com o chão do lado de fora todo forrado de branco. Chamei-os dizendo que estava nevando e fomos todos para o quintal. Eram pequeninos granizos que mais pareciam flocos de neve que logo apareceram esvoaçando pelo quintal. Dudu começou a catar os flocos de neve e jogar em mim. Foi uma guerra de bolas de neve por todos os lados. Ele deu gargalhadas quando uma bolota espatifou nas minhas nádegas. Devolvi o ataque, mas errei o alvo.

Foram muitas brincadeiras.

Dudu é meu amigo e os laços que nos unem ficaram muito mais fortes depois dessa viagem. Prometi que voltarei em 2025 quando ele fará dez anos. Certamente que encontrarei um pré-adolescente lindo, gentil, educado, corajoso, valente e ainda mais paciente com esta avó que tanto o ama.

Observação: por favor, assinem os comentários para eu saber quem são vocês. Obrigada

Fotografias: arquivo pessoal

                                                       Droid, personagem do Star wars

                                                     Spider web (árvore de elástico)


                                               Nave aérea que se transforma em tanque de combate



                                             Caminhando pelo Queens Park


                                       Dudu e eu na trilha do Anderson park em Invercargill


                                                 Dudu e o pai numa praia na ilha Norte


    Dudu e o pai lendo as instruções no Park das águas quentes vulcâncias na cidade de Rotorua, Ilha Norte


                                            Dudu e eu lendo na minha última noite em Alckland




                                          Indo tomar nosso breakfast no último dia - Auckland

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Crônica: Um belo estuário logo alí

 


Mais uma viagem-surpresa pelos arredores da cidade de Invercargill. Sentada no banco de trás na melhor companhia que poderia ter, meu neto, lá fomos nós por uma estrada quase vazia. Às margens, por todas as planícies, só víamos ovelhas. Depois de alguns quilômetros começaram a aparecer pequenas colinas e mais ovelhas.


- "Aqui dá pra fazer tobogãs", era Dudu pedindo ao pai que acelerasse o carro para sentir o prazer dos movimentos descendo os morros com velocidade elevada. Mas nada que pudesse ser comparado aos “tobogãs” da Avenida do Contorno em Belo Horizonte. Entretanto qualquer prazer seria louvável naquelas estradas nas pradarias.

Em poucos minutos pude ver aquilo que eu pensava ser o mar. Estávamos no encontro de um rio com o mar na cidade de Riverton. Do lado esquerdo águas azuis. Do lado direito águas azuis. Atravessamos uma estreita e comprida ponte já dentro da cidade.

A partir de então meus olhos se deliciaram com as charmosas casas nas encostas à nossa direita e o mar à esquerda. Logo à frente um parque infantil beirando o mar.

-"Vovó, ali tem tirolesa" e Dudu, esbaforido, foi saindo do carro e correndo para descer pendurado numa corda sobre a areia. O vento e o frio cortavam na pele do rosto. Dudu nem se importava. Ali estavam algumas mães com seus bebês, bem agasalhados, em carrinhos caminhando pela areia da praia. Alguns surfistas enfrentavam pequenas ondas, muitas pedras, água gelada e ventanias. Após muita brincadeira e querendo continuar brincando no parque, Dudu aceitou continuar viagem margeando o mar.

Entramos por um caminho sem asfalto, quase deserto, quando avistamos a imensidão do Oceano Pacífico cujas ondas vinham arrebentar-se nas pedras bem próximas ao caminho. Avistamos dois carros estacionados nos cantos da estrada arenosa. Era o final do caminho. Francisco me chamou para subirmos uma trilha até um mirante. Dani e Dudu ficaram explorando as pedras aonde as águas chegavam. Disseram que haviam visto um leão marinho morto estirado sobre as pedras.

Com meu filho me ajudando por alguns obstáculos e acidentes na trilha, chegamos ao mirante. Então pude ver o oceano do jeito que tanto queria ver. Lembrei-me de como os navegadores descobriram que a Terra era redonda e que eles não cairiam de suas margens caso ela fosse plana. Dali do alto poderíamos avistar um navio cargueiro se afastando da Ilha e, ao invés de ir diminuindo de tamanho como era de se esperar com a Terra plana, ele iria deixando de ser visto mas abaixando em sua altura.

Por alguns instantes fiquei imaginando os 
colonizadores anglo-europeus chegando com suas embarcações ainda em meados do século XIX. Os povos “maori” já se encontravam ali desde não se sabe quando, vindo das ilhas polinésias em busca de terras férteis e seguras contra ataques de outros povos da Polinésia, conforme foi contando por Dani. Falou também que Riverton foi uma das primeiras cidades da Nova Zelândia e que ela tem edifícios da época colonial hoje tombados pelo patrimônio histórico da Nova Zelândia. Estava explicado o fato de ter visto algumas construções com arquiteturas diferentes das atuais e alguns sobrados bem antigos.

A fome apertou e voltamos pra cidade para procurar lanches. Nenhuma lanchonete ou restaurante. Era tarde de domingo. Só água por todos os lados. Nesta hora veio o sabor de sabonete que senti ao comer o arroz colorido no restaurante do alto do penhasco em Queenstwon. “Alguns países asiáticos, como a Tailândia, usam lavandas para temperar o arroz”, havia explicado Dani que é uma grande conhecedora dos sabores.

Voltamos famintos e felizes com o passeio por mais uma cidade às margens do Pacífico. E eu bastante agradecida pela surpresa e pelas informações relatadas.

Voltei a Riverton outra vez em companhia da minha nova amiga santista, Ana, com seu marido, Koca, e Patrícia, sua nora. Fizemos os mesmos trajetos. Não havia tanto frio nem tanto vento. Koca desceu nos pedregulhos e nos mostrou as imensas algas marinhas trazidas até ali pelas marés. Li nas placas, em sua maioria com nome Maori que, aquela região é a baia Taramea onde são realizados vários esportes marinhos e terrestres.

Na volta Patrícia descobriu o Café Colombo às margens do rio que nos pareceu estar sendo inaugurado naquela manhã de sexta-feira. Caminhamos até o quebra mar para ver de perto as águas salgadas se encontrando com as águas doces.

Só ao procurar informações sobre a cidade de Riverton me dei conta de que havia entendido tudo errado acerca do nome da cidade que, por ser em inglês, pensei estar subentendido que a cidade tinha o nome do rio. Oh! my god! Pois bem, ali está o estuário formado pelos rios Aparima (antigamente chamado de rio Jacob) e Pourakino que se encontram com o mar formando um belíssimo e grandiosos estuário.

Em 1998 o nome oficial da cidade passou a ser Riverton / Aparima. E gostaria de voltar outra vez em Riverton. Amo rios com seus cursos e estuários assim como amo as histórias dos povos.

Observação: por favor, assinem os comentários para eu saber quem são vocês. Obrigada

Fotografias: arquivo pessoal



                                                         
                                                  Francisco e eu no mirante


                                    
                                Dani e eu num banco de madeira esculpido como um peixe






                        Dudu recebendo a tirolesa de outro menino


                                                  
                                                 Estuário



                                
Ana, Patrícia e eu na Taramea Bay, em Riverton


segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

Poema - Nosso amor






Nosso amor

Ainda exala o cheiro

Dos corpos

extasiados


Nossas juras

que não foram secretas

fizeram de mim

a esperança de

de ti


Nosso intenso amor

Fez de mim

Amante sem amado


Nosso amor

- Para sempre -

Acabou sem nós


Insepulto

Nosso amor

Fez-me viúva

De ti vivo


(03/12/2023)

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Crônica: Nossa viagem a Queenstown

                                


E chegou o dia da nossa viagem turística à bela cidade de Queenstown, na região de Otago, Ilha Sul da Nova Zelândia. Mochilas arrumadas, garrafinhas de água, blusas, luvas e cachecóis, caso fizessem frio e aquele vento cortante na carne. Muita animação e ansiedade. Faltaram os deliciosos lanches, feitos por meu filho e minha nora, que comemos durante a primeira viagem e que foram nossos almoços.


Dani, minha nora, já tinha providenciado todas as diversões e comprado os bilhetes que incluiam nossos almoços no alto do penhasco. Tudo que, até então, eu não sabia do que se tratava. Havia filas para entrarmos na estação das gôndolas. Fiquei perplexa diante da altura da montanha bem na orla do Lake Whakatipu, no centro da cidade.

Na primeira vez que viemos já havia visto aquelas gaiolas pequenas subindo o penhasco junto à montanha. Fiquei reparando a inclinação dos cabos de aço que sustentam as mesmas e, na minha abstração da geometria espacial, pensei que deveriam estar a menos de 20 graus em relação à montanha, quase na vertical, perpendicular ao centro da Terra, como ensinou minha nora, arquiteta. Confesso que aquilo não chamou minha atenção. “Umas gaiolinhas subindo o penhasco” desdenhei eu. Mas eu não teria coragem de entrar dentro daquilo de jeito algum.

No trajeto, mais uma vez, fui namorando as ovelhas e brincando com meu neto: “Dudu, me ajuda a contar quantos carneirinhos tem na beira da estrada. Estou no número oito mil setecentos e quarenta e cinco”. Mas ele nem fez caso das minhas contas.

Deixei-me surpreender, como se fosse a primeira vez, ao depararmos na estrada com o encontro do lago e as montanhas à nossa frente. Lembrei-me do grande poeta Mário Quintana ao interrogar: “Que haverá com a lua que sempre que a gente olha é com o súbito espanto da primeira vez?”.

Fiquei imaginando quão pequeninos somos diante de toda a grandiosidade da natureza que aqui, na Nova Zelândia, sempre aparece escancarada sob nossos olhares.

Chegamos e, como meu filho já havia avisado, teríamos que andar um “tanto bom”, pois ele deixaria o carro numa área verde que permitia quatro horas de estacionamento pago.

Para começar meu desvario com toda aquela beleza, tivemos que atravessar um parque cheio de famílias passeando com suas crianças. E o sol, naquele dia, nos presenteou com seu brilho. Nada de chuvas nem ventos.

Chegamos às ruas da cidade em direção às gaiolas. E qual não foi mais uma surpresa ao chegar à estação das gôndolas, a Skyline Queenstown. Enormes gaiolas de vidro subindo os quatrocentos e cinquenta metros de altura até um gigantesco complexo de aventuras lá no alto da montanha. Lojas de souvenires, o “Stratos Fare”, restaurante com buffet internacional, pista de parapentes, pistas com curvas em “S” para carrinhos de rolimã descendo numa parte da montanha.

Um sobe e desce de centenas de pessoas vindas de vários lugares da ilha e do mundo. Muitas rampas, elevadores, escadas, caminhos na montanha e, lá embaixo, o majestoso lago encantava-nos a todos.

- “Eu não vou descer neste carrinho de jeito algum!” Fui logo avisandoEra eu e meu medo de perder o controle, escapulir numa curva e voar pelo penhasco até o fundo do lago. "E se lá do fundo emergisse o gigantesco dragão que estaria apenas dormindo?"

- “Vai, vó. Não tem perigo, eu também vou”, era meu neto me animando àquela extravagância.

Mas eu via todos os perigos do mundo. Nunca tive experiências em carrinhos de rolimã na minha infância e, agora com sessenta e seis anos, ia lá descer num carrinho de rolimã, de plástico, montanha abaixo?

Enfim na fila, depois de não ter volta, segui adiante!

Após as instruções dos jovens, em inglês, com sinais e demonstrações nos “volantes”, lá fui eu. Os carrinhos saíam em pares. Fui com meu filho e meu neto foi com a mãe dele.

Dirigi tal e qual o Lewis Hamilton.

-“Quero descer de novo!” Foi minha resposta à pergunta do meu filho sobre se eu havia gostado. Só não voltei porque não aguentei percorrer a pé a rampa até pegarmos cadeiras com cabos de aço que subiriam de volta ao início da pista com os carrinhos de rolimã pendurados atrás. Dudu e Dani voltaram para descer outras vezes. Ele se esbaldou nas curvas e nos freios depois da primeira descida.

A partir daquela hora voltei para descansar numa das salas do restaurante e, enquanto aguardava, fiquei fotografando os corajosos turistas saltando de parapentes, bem ao meu lado, por sobre o penhasco.

Fim de tarde. Extasiada por tantas aventuras, tantas caminhadas e por tantas exuberâncias, voltamos por entre os jardins, margeando o lago até onde deixamos o carro.

Fim de passeio e a volta para casa na rodovia margeando o Lago Whakatipu.

Eis que, de repente, meu filho pára o carro e volta na estrada. "Muito estranhos essa mão inglesa e o volante à direita no carro", pensava. Voltou uns cem metros e estacionou o carro num pequeno descampado à margem da rodovia.

Estávamos bem próximos ao lago. Descemos poucos metros e fomos conferir a temperatura da água. Então vimos um belo riacho descendo da montanha e desaguando ali no lago. Nesta hora, meus olhos de mineira nascida às margens do Rio Xopotó, também desaguaram.

Meu filho e meu neto brincaram de atirar pedras sobre a superfície do lago para verem o fenômeno delas repicando na água. Dudu não resistiu e colocou seus pés na água gelada.

Hora de retomarmos a estrada que nos aguardava cheia dos carneirinhos por todo o trajeto. Mas “acho que alguns deles já deveriam estar dormindo”.


Queenstown, Sua Majestade, a Vila da Rainha.

Fim de viagem.

22/10/2023


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Fotografias: arquivo pessoal


Nós  na beirada do riacho desaguando no lago




Dani, Dudu e Francisco brincando






                                                      Eu na varanda do restaurante


                                  Meu filho e Dudu
 



quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Crônica: Viagem necessária e deslumbrante pela Ilha Sul de Nova Zelândia


Queenstown e o Lago Whakatipu

A primeira viagem àquela cidade se deu por outros motivos que não aquele desejado por meu filho e por minha nora. Nem por isto foi menos impactante. Conhecer, desde a rodovia até aquele pedaço de chão que, provavelmente, foi desenhado pelos deuses do olimpo, me deixou em silêncio.

Os primeiros cem quilômetros foram semelhantes aos já conhecidos pelas campinas verdejantes com milhares de ovelhas espalhadas por eles. Mas logo depois começaram a aparecer montanhas, suaves curvas, pequenos aclives e, não mais que de repente, após uma curva, meus olhos miraram um mundão de água e, bem ao alto, as montanhas nevadas. Meu filho, argumentando que seria melhor viajar no banco de trás devido às intensas dores lombálgicas, me colocou no banco dianteiro, então pude ter essa visão privilegiada bem à minha frente. Meus olhos, nesse instante, já umedecidos pela emoção, corriam das águas azuis à minha esquerda às montanhas nevadas por todos os lados.

Tratá-se do Lake Wakatipu, na língua Māori e, conforme contou minha nora, ele tem a forma de um "S" pois, segundo uma lenda desse povo,
 o formato do lago se deu devido ao fato de um grande guerreiro Māori ter vencido a luta contra um dragão e ter jogado ali o corpo do  mesmo. O lago tem 81 quilômetros de comprimento, sendo o mais longo da Nova Zelândia e tem 289 Km² de extensão. Suas águas são de um azul incomparável. As neves descendo pelas montanhas foi outro espetáculo indescritível. Obviamente que fiquei estupefata com a beleza de toda a região. Por todo o restante do percurso a estrada vai margeando o lago, quase tocando nele em alguns pontos e curvas.

Meus olhos, que ainda não haviam se acostumado com tanta beleza, depararam mais adiante com a cidade de Queenstown, às margens do lago, com os alpes nevados ao fundo. Conhecida por seus esportes de aventura, seus vinhedos e suas belezas naturais, ela atrai turistas do mundo inteiro. Nunca havia imaginado uma cidade tão bela no país embora uma "sobrinha torta" que morou por aqui tivesse me dito que “Queenstown é a cidade que mais gosto de lá”, porém não me advertiu sobre suas belezas.

Mas, como nossa ida se deu por motivos outros, logo minha nora, a motorista, localizou a casa da doutora especialista em medicina oriental, com excelentes referências. A casa, um chalé azul claro encrustado na montanha, com muitas janelas de vidro, foi logo encontrada na avenida por onde se chega à cidade.

Exames com meu filho de cueca, apalpações, perguntas e logo foi detectado o ponto de tantas dores. Acupuntura com as terríveis agulhas, massagens pesadas, infiltração de analgésicos (seria vitamina B12 com corticoídes?) e técnicas de relaxamento foram aplicadas. Ali eu era tão só a mãe do doente. Aproveitei e fiquei observando todo o espaço. A mim pareceu mais a casa de uma mulher velha, portadora de grande sabedoria e que teria vivido na idade média. Havia muitos livros em chinês, mapas de inervações em corpos humanos, utensílios da cultura chinesa, decorações orientais, tapetes, poltronas, incensos, e muito funcho plantado aos arredores da casa.

Prescreveu mastigação de funcho, medicamentos fitoterápicos com bulas em chinês. Ela respondeu a todas as perguntas (em inglês) do meu netinho que estava angustiado com as dores do pai. Autorizou que eu fotografasse alguns locais da casa, sendo extremamente simpática com todos nós. Mais tarde saberíamos que tal especialista havia sido também formada em medicina ocidental e fora cirurgiã ortopédica.

Meu filho, aliviado com o tratamento de urgência, ainda quis passear um pouco pela cidade encantada. Modernos parques infantis na beira do lago, flores por todos os lados, ventos frios soprando do lago, patos nadando e pescando seus jantares. Eu queria uma coxinha bem brasileira, disse brincando para meu filho. “Então vamos ali” disse ele e caminhamos por uma rua próxima quando deparei com uma portinha de vidro. Entramos e fizemos o pedido. Arriscamos sentar do lado de fora. Foi então que vi a decoração. Pregados na parede estavam Frida Kalo, Che Guevara, cantores e danças caribenhas, e tudo que se relacionasse ao Caribe. Estava explicada a simpatia do atendimento. E eu nunca havia comido uma coxinha tão grande, crocante e deliciosa. A seguir passeamos pela orla do lago, entramos e saímos de áreas de jardim, árvores enormes e estruturas maoris.

Voltamos para casa no final da tarde. Eu extasiada com tanta beleza e com a promessa do meu filho e da minha nora de que voltaríamos para fazermos turismo.

Na próxima crônica contarei sobre a volta a Queenstown e nossas aventuras num carrinho de rolimã montanha abaixo.


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Fotografias: arquivo pessoal




                                                   Eu e a vista do lago da casa da doutora


                                                                  


                                                Dudu escalando uma árvore nas areisa da praia do lago






Bar caribenho





                                                 Primeira vista do lado e das montanhas




                                Visão de uma nuvem gigantesca quase encostando nas montanhas



                                         Escultura em madeira na casa da acupunturista





                                                    Escultura maori nos jardins da cidade

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Poesia: Minha Mãe


Nasceu Maria José

Homenagem a São José do Porto

Fazenda da família

Cresceu sob os mandos do avó italiano

do pai veio a retidão da vida

da mãe apanhou a doçura da juventude,

da vida vieram as letras

Após virar a lua entregou-se

àquele que jurou voltar.

Quando mulher 

casou-se com o esperado.


Noutra cidade

amargurou-lhe a vida 

as palavras emudeceram

os pensamentos assombraram


O viver deu lugar à loucura.

Nunca mais voltou a ser menina


13/10/2023









dia 11/10/2023

segunda-feira, 9 de outubro de 2023

Crônica: No meio da estrada tinha um leão-marinho

                                              

Mais uma viagem surpresa. 

Lá fui eu acompanhada do meu filho, da minha nora, que ora foi a motorista, e do meu neto.

Logo que saímos da linda Invercargill, cidade mais ao sul, no litoral da Ilha Sul de Nova Zelândia, entramos por uma estrada estreita que me fez lembrar nossas estradinhas mineiras. De um lado e de outro, inúmeras campinas verdes com dezenas de rebanhos de ovelhas. (Serão quantas as cabeças de ovelhas nessa região? Será que o governo sabe qual é a proporção de cabeças de ovelhas por habitante?) Era eu e meus pensamentos.

Para mim todos aqueles carneirinhos saltitantes, próximas às suas mães, eram os carneirinhos de gesso que enfeitavam o presépio da minha infância. Acho que, todos aqueles que desapareciam do presépio ano após ano, vieram povoar esse país tão gelado. E hoje, para mim, eles são tantos que é impossível saber quantos são.

Todos nós calados no interior do carro. Eu viajava para dentro de mim.

Paramos numa bela construção, no meio do nada, para nosso primeiro café. A Fortrose estava fechada. Como médica, pensei cá comigo rindo sozinha, “Quatro (four) com artrose”. FortRose, disse minha nora.

Logo começou outro tipo de vegetação. As campinas com os rebanhos de ovelhas deram lugar a grandes árvores tombadas pela força dos ventos marítimos.

Continuamos nosso caminho até Curio Bay, uma charmosa enseada rodeada de pequenas trilhas. Tomamos nosso café no restaurante ao lado e embrenhamos pelas trilhas, a pé. A massa asfáltica que cobria trechos das trilhas, no entorno do restaurante, eram tão suaves que me lembravam massa de pão de ló. Logo adiante uma placa avisava aos desavisados que ali é uma área sujeita a tsunamis e, portanto, não deveriam ter acampamentos. Meu coração começou a bater mais forte diante de tal informação. Então avistei uma fazenda do outro lado de onde estávamos, e ela me parecia muito próxima ao penhasco. Neste instante uma verdadeira enxurrada de pensamentos invadiu minha cabeça, (foto abaixo). Volta e meia eu olhava para aquela casa linda lá em cima, bem defronte ao oceano Pacífico que apresentava risco de tsunami. 

As placas também informavam sobre a existência de algumas espécies de aves em extinção, incluindo o pinguim dos olhos amarelos, naquela região. Aqui na Nova Zelândia existe um departamento do governo com vários especialistas, estudiosos e voluntários cuidando dessas aves e desses lugares fantásticos

Andamos por mais uma pequena distância e eis que de repente damos de cara com o penhasco, lá embaixo as ondas e os ventos batendo forte sobre aquilo que eu pensava serem pedras enegrecidas. Descemos por uma escada íngreme e segura, beirando o penhasco e já estávamos na praia. As ondas vinham fortes e batiam próximas a nós. Foi então que meu filho me mostrou um tronco de árvore caído na areia preta e eles me desvendaram o segredo do nosso passeio. Estávamos numa floresta fossilizada de 178 milhões de anos, do período Jurássico. Toda a área vem sendo protegida e visitada por vários estudiosos interessados nessa era do nosso planeta Terra. Eu, com medo das ondas que cada vez chegavam mais perto de nós, não me contive e coloquei meu pé numa raiz fossilizada de 178 milhões de anos. (foto baixo).

Subimos rápido pelas escadarias e já as ondas cobriam a raiz e o tronco de pedra. Voltamos para o carro mas, minha nora queria ver mais. Então nos dirigimos para outro ponto do penhasco.

Por todos os pontos o vento forte nos empurrava em direção ao mar. Agarrei meu neto que se esbaldava com tudo aquilo.

Depois fui ver o mapa e constatei exatamente o que eu pensava. Um pequeno pedaço de terra alta ainda teimava em enfrentar a violência das ondas e dos ventos.

Hora de voltarmos para casa. Eis que, quando o carro desacelera para pegar a estrada, Dudu, fala: “volta aí mamãe, tem um bicho alí”.

Ao dar a ré deparamos com um enorme bicho deitado sob a sombra de uma moita de planta que me lembrou a piteira das Minas Gerais. Seria uma escultura? Seria um bicho morto? Meu filho desceu do carro e lhe dei o celular para fotografá-lo. “É um leão marinho”, disse meu neto. E cada um de nós queria entender sobre o bicho tranquilo a dormir. Seria uma morsa, uma foca, um leão marinho?

Deixamos o bicho marinho na sua soneca e voltamos para casa com muita história para contar sobre nossa viagem à região de Catlins, no extremo sudeste da ilha sul de Nova Zelândia.

Nota: a escolha do título foi do meu neto, Dudu.


09/10/2023

Observação: por favor, assinem os comentários para eu saber quem são vocês. Certo?









                                                  Raiz de uma árvoe fossilizada


                                                      Tronco de árvore fossilizado


                                                    Floresta fossilizada


                                                            Fazenda no alto do penhasco














sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Primeira oficina de setembro de 2023

                                                 Flor do meio dia

ALONGAMENTO: Manoel Bandeira

Manoel Bandeira e eu

Se me deixas aqui

Daqui não saio

Faço versos como quem chora

E só os anjos me compreendem

Eu faço versos como quem morre

Duplico minhas incompreensões

Minh’alma sofre do imenso passado



Já me tomei alegria

Hoje tomo tristeza

Estou fora de mim

Não consigo me amar

Sinto as coisas mais simples

Para delas extrair minha vida

Então,

descanço meus olhos de cores índicos

e sonho.



ALONGAMENTO- 2

Vou-me para o Guarujá

Vou-me embora do Ingá

Lá dancei sobre o luar nas Estampas de Eucalol

Lá contemplei a noite no terreiro abandonado



Vou-me embora do Ingá

lá conheci o rei

Ele me desejava tão só

enquanto sua fêmea

Eu queria mais

queria ser sua mulher

Queria olhares indecentes

E palavras escandalosas



Vou-me embora do Ingá

Lá meu rei bebe demais

Meu rei não me vê

nem me chama de sua rainha



Vou-me embora para o Guarujá

Lá tenho todos os amores

Lá sou sultana das terras de ouro

E os filhos que Deus me deu

Eu os tenho lá






ALONGAMENTO – 3
Caio
Nunca tinha ouvido esse nome até aparecer um personagem na novela Selva de Pedras, chamado Caio Vilhena, no ano de 1972. Obvio que me apaixonei por eles, tanto o mocinho quanto o galã, Carlos Eduardo Dolabela. Vai daí então que ganhei um filhote de cachorrinho da raça pudor. Eu nem sabia que cachorros tinham raças. Foi paixão à primeira vista. Eu, uma adolescente solitária, e Caio veio pra ser meu amigo e confidente.
Numa volta da escola, na hora do almoço, Caio não foi me esperar conforme fazia todos os dias. Entrei em casa e fui logo entendendo. Minha mãe, que não gostava de cachorros, deu um sumiço nele alegando que eu não cuidava dele como deveria. Uma mistura de ódio e tristeza me levou a isolar ainda mais.
Não sei se perdoei minha mãe por isto, mas nunca deixei de amá-la.


ALONGAMENTO – 4

Ele a convidou para uma palestra na casa de oração espírita onde falaria sobre a “Boa Samaritana”. Ela aceitou o convite pelos olhares dele. Ele não falou. Errou a data de sua fala. Seria noutra semana. Depois a convidou para uma pizza. Lá se foram eles. Ele de alma. Ela de corpo. Ele, provavelmente, só pensando na Boa Samaritana. Ela incorporada de Maria Madalena.

No final da noite ele a deixou em casa. Foi dormir com a alma samaritana. Ela ficou acordada com seu corpo afogueado de Maria Madalena, nada arrependida.

Maria do Rosário Nogueira Rivelli

Invercargil, Nova Zelândia


                             
                    Milford Sounds (Nova Zelândia)


Comentários do mestre, Ronald Claver

"Rosário, boa tarde ou boa noite? Não sei, esta mania sua de dar volta ao mundo dá nisso. Lá e cá , cá e lá.


O importante que a escrita continua fiel e ferina, humorada e sensual. Toma um gole de versos do Bandeira, toma um pouco da tristeza, mas a alegria das palavras fala mais e mais da arte de tecer um texto. Bem humorado o poema tem a cara da autora nas palavras do poeta.


Vou me embora do Ingá e para o Guarujá (até rimou) também uma paródia gostosa de apreciar e delirar. Um pouco de tudo: ironia, humor, sabedoria de quem tem o baralho das palavas.


Caio, caio. Cachorro é um amor que se dá sem pedir. Torna-se irmão, um amor só. E a falta dele faz um vazio danado. A gente o vê por toda a casa, mas cadê ele? Foi-se como um amor eterno, acho que sim, muito bonito e comovente.


Não poderia faltar a Madalena, o desejo, o querer, o sexo, o amor total. Samaritana que nada, delírios de amor não faltam e nem podem faltar. Continue escrevendo ágil e bem humorada e aproveite o outro lado da lua, é lá que você está, bjs


Ronald Claver"