terça-feira, 26 de janeiro de 2021

História Infanti- As aventuras de "Igui de la Mancha"

 

(Delicadezas em tempos do Coronavírus - XXXIV)




Meu neto de cinco anos decidiu mudar de classe animal. Agora ele se tornou um gato. O gato IGUI, com toda a elegância que a pronúncia exige. Chegou a nomear-se de "Igui Igor de la Mancha" ou "Igui Lacan de la Mancha" mas acabou abandonando os segundos nomes. Agora faz questão de manter o “De La Mancha”, provavelmente por suas incursões nos moinhos de vento do Dom Quixote, leitura atual de seu pai que não é gato, mas divide com ele suas imaginações.


Pois bem, em visita recente e demorada à casa do meu neto, Igui, fui convidada por ele para uma viagem ao Uruguai – atentem para a quantidade de vogais iguais repetidas e para a pronúncia – uma vez que decidira morar naquele país que faz divisa, ao sul, com o Brasil.

Imediatamente aceitei o convite e entramos no confortável Honda Fit da mãe dele. O pai arrumou todo o conforto possível para os viajantes. Ali estavam, além do Igui, gatos e gatas da família e um gato amigo.

E lá fomos nós de Minas Gerais, Brasil, para as terras uruguaias. Igui começou a dirigir, mas logo cansou das estradas. Foi dormir junto aos companheiros e companheiras no espaço cheio de cobertores e almofadas.

-“Durma bastante e assim aproveitarei para ganharmos mais estrada”- disse-lhe eu.

- Ok motorista! Mas como é mesmo o seu nome? -perguntou-me ele.

- Marina – respondi-lhe

Igui dormiu até São Paulo quando o acordei para um café da manhã. Ele pediu leite com chocolate meio amargo, pão francês e ovos mexidos.

- Não esqueça de comprar bastante água e leite para seus amiguinhos! - Lembrei-lhe, pois afinal ele era o chefe daquela expedição.

Voltamos para as estradas em direção ao Paraná. Falei sobre a bela cidade de Curitiba e seu planejamento urbano reconhecido em todo o mundo. Ele, então, decidiu almoçar por lá.

Entretanto, devido a sua ansiedade para chegar no Uruguai, pediu que fôssemos ligeiros.

- Daqui a pouco estaremos em Santa Catarina e eu gostaria muito de conhecer Florianópolis, a capital do estado que é uma ilha. – Fui logo dizendo prá ele.

Igui aceitou minha sugestão desde que não atrasássemos muito por ali. Decidimos passar apenas pela parte continental da cidade.

Diminui a velocidade do carro para ver as maravilhosas praias catarinenses quando, de repente, Spock saltou do carro e pulou para cima do capô vermelho.

- Cuidado! - alertou Igui.

- Acho que ele queria também ver o mar e pegar uma onda – meu chefinho deu uma risada da minha resposta.

Paramos e o gato rajado de branco e amarelo deu outro salto; agora para dentro do carro.

Todos tranquilos, voltamos para nossa viagem. Já estava anoitecendo e ver o por do sol naquela região foi um espetáculo.

Igui já havia reservado nosso hotel. Ou melhor, o hotel para os gatos, mas que aceitava uma humana também. Hotel Aguaboia. Bem na divisa com o estado do Rio Grande do Sul.

Foi só nesse momento que as gatas dorminhocas acordaram. Ou seja, acordaram para dormirem no hotel de cem estrelas. Porque hotel para gatos é sempre sobre os telhados. Foi neste hotel que Mingau comeu todo o creme de milho verde com muita canela que estava sobre a mesa. 

- Não conseguirei atravessar os quase setecentos quilômetros de extensão do estado até a divisa com seu país num só dia. – Comuniquei para o felino dos pelos pretos e luminosos que era o meu chefe.

- Não tem problemas – foi logo respondendo.
 Já reservei o Cats Hotel. Vamos dormir lá e voltaremos a pegar a rodovia bem de madrugada. Quero chegar no Uruguai ainda amanhã. Tudo bem? – perguntou-me ele, o gato Igui.

Contei-lhe que a cidade brasileira mais ao sul do país chama-se Uruguaiana. Foi o bastante para ele antever seu amor pela cidade.

Dormimos em Pelotas, bem pertinho da Lagoa do Patos, a maior laguna do Brasil, disse ao meu “cat-boss”. Disse também que tenho um amigo naquela linda cidade e que os habitantes do estado são chamados de gaúchos. Mas ele já nem me ouvia. Seu coração batia acelerado. Queria logo chegar ao país que escolhera para morar.

Como motorista e viajante das estradas – lembro que não gosto das viagens de avião – contei-lhe sobre minha viagem àquele país há alguns anos, quando também havia pensado em mudar para lá.

Meu amor pelos nossos vizinhos uruguaios já era antigo. O futebol uruguaio é um dos melhores do mundo e vários jogadores de lá já brilharam no nosso querido Clube Atlético Mineiro. Tentei explicar, aos modos de gato, sobre o escritor uruguaio, Eduardo Galeano – xará do nome humano do meu neto - de quem gosto muito. E o orgulho do povo de lá do grande ex-presidente e cidadão, José Mujica, a quem também tanto admiro. 

Ficou atento a tudo que eu disse. Não era apenas pelas vogais repetidas e pelo som semelhante ao seu nome que meu neto escolhera aquele país para viver. 

 Prestava atenção em tudo que dizia.

E quase explodiu de tanta felicidade quando atravessamos a divisa com o Uruguai. Não se conteve e acordou Princesa Consuelo e Nina que dormiam até aquele momento. Spock pulou logo para fora do possante vermelho e saltitava de alegria.

Dormimos em Montevideo, num amplo Cats-Hotel, na parte antiga da cidade. À noite todos os gatos saíram para se divertir em torno do mercado do peixe e da carne de boi.

Obviamente que, após refastelarem da melhor carne bovina da América do Sul, dormiram em “berço-esplêndido”, ou melhor, em telhado iluminado.

Mas meu chefe ainda queria mais. Conhecer o Mar Del Plata na região da única cidade portuguesa do Uruguai, a maravilhosa e pequenina cidade de Colônia de Sacramento à beira do mar Del Plata. Do outro lado do mar a capital da Argentina, Buenos Aires.

Os cinco amigos gatos ficaram ali. Parados. Sentados sobre as patinhas traseiras. Fixaram seus olhares na imensidão das águas prateadas daquele mar.

Foi então que aconteceu o imprevisto que me alegrou profundamente. Enquanto eu admirava tudo em torno os gatos, deslumbrados com as ondas prateadas do mar, voltaram às suas formas humanas.

Ali, ao meu lado, estavam Olívia, Aninha, Samuel, César e meu neto, Dudu. 







Fotografias de Fernando Cunha@fedasunha

Conselheiro Lafaiete, 26 de janeiro de 2021