Era um domingo como tantos outros em que as famílias se reúnem para o almoço feito com carinho e muito sabor. Como tantas vezes acontece, alguém colocou fogo para aplacar a “sujeira” de folhas e galhos secos. O calor intenso do final de semana e os inclementes raios solares foram os combustíveis perfeitos para que o pequeno e improvável fogo se espalhasse pela mata próxima.
À noite já podíamos sentir os olhos ressecados e o ar com cheiro de fumaça. Vizinhos alertando para o fogo esparramando e já solicitando presença do corpo de bombeiros que, com a alta demanda por toda a região metropolitana, não respondeu aos vários pedidos de socorro.
Na segunda-feira o fogo pulava como criança, ia de um lugar a outro com a mesma agilidade e esperteza infantis. Vizinhos alarmados davam notícias, pediam ajuda para impedir a chegada do fogo até as casas. Nesta hora a ajuda de todos foi imprescindível. A união dos moradores foi abençoada.
Os poderes públicos, com a prefeita, com nossa vereadora, com a Defesa civil e o corpo de bombeiros, iam e vinham, literalmente, apagando fogo aqui e acolá. Meus olhos só viam. Mas meu coração, desesperado, emudecia. Lia e ouvia as mensagens do grupo de whatsApp que nunca fora de tanta utilidade. Queria estar junto. Reconheço minha inércia. Paralisei-me. Confesso que senti inveja de todos que lutaram contra o fogo.
E o fogo comia tudo com avidez, ele estava deveras, esfomeado. Pássaros voavam desnorteados. Tucanos vieram beber água na minha bacia. O vento da noite de segunda-feira espalhou ainda mais as línguas flamejantes. Dormir, nem pensar. O canto do fogo, como se tagarelasse, estalava nos nossos ouvidos. Toalhas no chão encharcadas de água para apaziguar a rarefação do ar.
Na terça-feira o fogo comedor chegou à serra que divide nossa Mário Campos com Brumadinho. Então chegaram as ajudas especializadas. Helicópteros e um avião amarelo faziam seus trabalhos. Mapeavam, apagavam, voavam para lá e pra cá. O fogo implacável teimava em resistir.
Num determinado momento uma moradora nos falava aflita que uma árvore bem próxima à sua casa, havia pegado fogo sem mais nem menos, "como se estivesse caindo fogo do céu".
Não tenho dúvidas do tanto que aprendemos com esta tragédia. Fogo mata. Folhas e galhos secos viram estercos se misturados a terra. Lembro, mais uma vez, do nosso filósofo e ambientalista, Airton Krenak, quando diz que fazemos parte da natureza, somos da natureza como a flora, pois somos do reino animal. Se matarmos a natureza, estamos fadados a exterminar com nossa espécie. Ou seja, deixaremos de existir.
Finalizando, proponho à prefeita municipal, Andresa Rodrigues, à câmara municipal, aqui representada pela vereadora Sammantta Bleme, e aos vários líderes da nossa região, a implantação de um grande projeto de reflorestamento em parceria com institutos e universidades federais, com as escolas do município e com a comunidade em geral.
Que tal transformamos a trágica experiência do fogo num belo projeto? Que tal o pequeno município de Mário Campos tornar-se exemplo para Minas e para o Brasil no reflorestamento de áreas desvastadas pelo fogo?
E a chuva chegou na quarta-feira.
“Abensonhada” chuva (*).
“Abensonhada” chuva (*).
(manhã de quinta-feira, dia 09/10/2025
Observação: crônica publicada originalmente na Página "Salve o Funil" no meu perfil do facebook.