Elis nunca ficava na cama além do sono. Levantava com o mesmo ânimo de todos os dias. Nada tirava dela a disposição para o trabalho, seja na cozinha com o marido ou na loja onde dividia as vendas e as contas com uma amiga arrumada nos tempos recentes.
Naquele dia estava mais desperta que noutros. O marido nada percebeu que pudesse deixar de lado suas encomendas de salgados e um bolo de aniversário, "no capricho" como recomendara a mãe da menina: "Ela quer um bolo de chocolate com cobertura de brigadeiro e recheio de morangos". Ele era um excelente cozinheiro e fazia bolos como ninguém.
Joel viu a esposa se arrumar e sair cedo de casa. Disse que havia faturas vencendo e deveria ir ao banco para paga-las. Ele só percebera que ela havia usado um perfume diferente. "Mais forte", sentira ele.
Elis saiu mansa no jardim da casa e caminhou lento em direção à rua. Atravessara a bela avenida bem próxima dali. Olhou os meninos brincando no parque. Nunca sentira vontade de fazer os exercícios na academia de rua onde estavam agora várias pessoas aproveitando a manhã de primavera. Parou defronte a um belo condomínio de luxo e, sem se preocupar com outros moradores do prédio, chamou no interfone o número de sempre. O porteiro abriu-lhe a porta de vidro e ela entrou.
Após ser conduzida para a ampla sala daquele imóvel antigo e tão lindo, Elis deslizou pelo corredor a deixar rastro do caro perfume francês e provocar aquele homem como só ela sabia e desfrutava desta sapiência para conseguir dele o que bem quisesse. Andava como uma gazela. Ora virava o rosto para se deixar ser vista. Outras vezes olhava com olhos de falso desejo. Ele nem se importava com o jogo de sedução dela. Sabia que por qualquer pequena bagatela ela se entregaria a ele. Mas ele também sabia lhe fazer a corte.
Ofereceu uma mesa de café com frutas e flores. Ao lado uma caixinha cuidadosamente embrulhada. Um presente.
- Depois você pode desembrulhar. Mas agora fique comigo.
Era um velho gordo, sem modos de apaixonado, fazendo-se de mocinho e garanhão. Sem finezas no trato com o corpo dela. Fora logo arrastando-a para seu quarto. Um desajeitado quarto de viúvo, sem quaisquer atrativos. Um oratório empoeirado com várias imagens de seus santos e santas protetores. Ali nada cheirava bem. Até seu perfume era inebriante e adocicado. Ele montou em cima dela como um touro desajeitado. Fungou no seu pescoço. Ela fingia sofreguidão. Gemia como uma gata no cio. Cumpria bem seu papel.
Depois de muito tentar seu prazer prá lá de esquisito ele se dizia satisfeito e a empurrava para fora da cama. Corria ao banheiro para se lavar dela. Com nojo da mulher que lhe fazia desobedecer as leis da santa amada igreja. Então ele a conduzia de volta ao corredor. Paravam perto da mesa ainda posta para um café charmoso. Ela apoiava sua bolsa sobre uma cadeira e pegava a caixinha do presente. Mostrava para ele as faturas a serem pagas e as colocava sobre a mesa, no lugar onde antes havia seu presente.
Ele a levava até a porta e sem toques de amor ou respeito a colocava de volta na entrada do prédio.
Elis refazia seu trajeto. Entrava em casa e ia direto ao seu quarto. Abria a caixinha e encontrava uma bijuteria barata e sem gosto que ela usava como se ouro fosse. O marido lhe perguntava se fora tudo bem no banco.
- Ah sim tudo bem. Até encontrei seu amigo, Sergio, por lá. Ele disse que virá comer uma peixada conosco numa noite dessas.
E uma semana depois o amigo aparecia e via Elis com os brincos que lhe dera. Ficaram todos rindo, bebendo a branquinha e comendo peixes.
Até combinaram uma viagem à praia juntos, os três.
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