terça-feira, 30 de maio de 2017

Fábula: Assembleia dos bichos

E foi em Inhotim, naquele belo canto do planeta Terra, que os amigos bichos resolveram se encontrar. Depois de muitas discussões para escolha da data, do local e quais bichos viriam para o referido encontro, acertaram que tal deveria acontecer no último final de semana de maio e no centro de arte contemporânea, na cidade de Brumadinho.


A Preguiça foi quem tivera a ideia. Obviamente que tudo seria no seu tempo. Solicitou ajuda da tão esperta Suricato, uma grande amiga que sempre está pronta para cooperar com os demais membros de sua espécie quando são ameaçados por impiedosos predadores. Suricato tão logo aceitara o pedido da velha companheira, começou a definir papéis, ditando ordens e pegando o rumo daquela tão importante conferência.

A Marmotta, cujo marido era o Senhor Castor das palavras enroladas do Canadá, sabia tudo sobre as boas maneiras na política da mata e se tornava uma hiena na defesa dos direitos conquistados e inalienáveis de todos os demais bichos das florestas. Diziam as boas línguas que Marmotta era tão brava e tão justa que mesmo os mais conservadores bichos homens das políticas meritocráticas, respeitavam e admiravam seus discursos.

E assim fora formado o triunvirato das fêmeas para comando da conferência.

Todos os bichos foram convidados mas poucos estavam dispostos para aquela discussão.

Na pauta constavam a supremacia da floresta e os desentendimentos dos bichos homens.

O Avestruz comunicara que viria com sua esposa pianista e artista. Sem nenhuma vergonha aparente a bela ave chegou e logo se acomodou muito bem nos espaços destinados para todos. Muito simpático com os demais colegas. Entretanto parece que comera algo pelo caminho que não lhe caíra bem no papo nem na bexiga e, por tal motivo, sempre se encontrava à procura das portas dos banheiros perfumados da floresta. E fora nessas horas que o Macaco deu grandes gargalhadas sob os protestos disciplinatórios de sua esposa, a macaca Mari. E quem diria que o maior amigo do Macaco fosse o tão tímido Avestruz? Unha e carne, diriam todos. 

O Macaco não era nada fácil. Vivia pulando de um galho para outro sem prestar atenção em nada. Conta-se que ele nunca soubera a senha de seu cartão bancário. E dizia ele que escondia seu dinheiro "na sua caixa 2". Dentro da meia. Às vezes esquecia em qual pé estava a tal bufunfa que acabava ficando por lá sob os odores de tal ambiente. Mas aquele Macaco era do bem e nem se importava com suas macaquices e invencionices.

Viera também o Senhor Coelho, sempre muito atento a tudo. Nada lhe passava despercebido. Por coincidência da natureza, a nova esposa do Senhor Coelho também se chamava Mari. E as Maris se entenderam para além de seus nomes. Ao Senhor Coelho, também, nada passava sem o foco de suas lentes. Com seu Apple-watch de três mil dólares e seu IPhone 7 ficava ele filmando os arredores e conectando com todas as florestas do planeta. Estava por demais feliz. Afinal era o dia de seu aniversário e os amigos bichos lhe cantaram o "Parabéns".

Todos atentos, calados e fora decretada aberta a assembléia mesmo na ausência da Senhora Preguiça que, naquele dia, estava deveras muito vagarosa. Tinha avisado que atrasaria alguns minutos. 

O Macaco também pedira que esperassem um pouco pois o Avestruz, seu amigo, havia ido ao banheiro mais uma vez.

Suricato tomara a palavra e iniciara a apresentação da pauta:

Primeiramente "Fora Morcego" que usurpara o poder da floresta de forma ilegítima pois o senhor Touro em Pé, eleito democraticamente pelos bichos da floresta, fora tirado de seu governo antes de terminado seu tempo constitucional. 

"Um parentese por favor", chegou e falou a anfitriã daquelas terras.

"O Senhor Touro Em Pé estará conosco ainda nesta noite e poderá nos dar seu depoimento"

O companheiro Touro havia dito que não poderia comparecer naquela hora pois estaria no aniversário de uma correligionária. "Imperdível", dissera ele, uma vez que ela era uma multiplicadora dos seus votos. Muito querida aquela senhora vaca.

A Senhora Preguiça também comunicara a ausência do Senhor Coruja, sonhador, usuário de limonadas nas noites mal dormidas e poeta das madrugadas, que se desculpou alegando problemas de saúde na família embora afirmasse presença de coração e mente. 

Perdoados os bichos ausentes deu-se reinicio à assembléia.

Com muita preguiça, a Senhora Preguiça, informara a pauta número dois qual seja: a imensa saudade de todos os bichos que, nos últimos trinta e cinco anos, haviam se isolado em seus habitats e ela  sentia-se carente do convívio com todos.  O seu coração doía e o ar que entrava nos seus pulmões não queria sair. Tudo emoções. Tudo saudades. Nesta hora todos os bichos fungaram forte e, algumas lágrimas, rolaram pelo chão do Senhor Tim.

E a terceira e última pauta dizia respeito à realização de novas assembleias destes e de outros bichos antes que o inverno chegasse e alguns corações deixassem de bater.

Então, neste final a senhora Preguiça agradeceu a presença de todos. Saiu devagar e voltou para escalar o mais alto dos jatobás. Talvez chegará lá ainda no tempo de descer e não perder a próxima assembleia a ser realizada na primavera, na residencia do Senhor Macaco, lá pelo sul das Minas Gerais ou, quem sabe no paraíso terrestre do Senhor Ratinho, paisagista e doutor.

Então fora encerrada a assembléia e cada bicho tomou rumo de casa. E toda a floresta silenciou.


29/05/2017


*Esta fábula é mais um "dever de casa" da Oficina de Literatura ministrada pelo escritor e poeta Ronald Claver.


Um comentário:

  1. Amei!
    Emocionei e me diverti com esse encontro, que parece ter sido "o bicho".Ri muito do macaco que não sabe a senha do banco e do avestruz com piriri.��

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