E foi bem ali que o fogo começou.
Olhei várias vezes aquele espetáculo entre a terra e o céu
De repente já eram duas gigantescas línguas lambendo a serra
E elas se multiplicaram velozmente
Eu ali, ainda incrédula, diante das chamas.
Ora as linhas vermelhas deitavam no meio da serra
ora ficavam dependuradas como se caíssem em pingos de fogo
A noite só começava
Era quinta de feira na avenida
Muitas pessoas foram degustar as delícias da região
Eu também.
Mas as línguas de fogo eram mais gulosas
Devoravam tudo
Vegetações e animais
O cerrado morria e virava cinzas
O cheiro de fumaça invadia a cidade
Eu ainda ali. Inerte. Impotente.
Meu olhar cambiava entre o fogo e a festa
Sobrevivi aos destroços de mim.
Quando a noite já ia alta
Dei jeito e rumo de casa.
Eu e a devastação da serra
dentro de mim
Eis que ao ir embora o vejo
Tentava atravessar a avenida
Meu carro e eu passávamos
no exato momento.
Quantos anos se passaram
desde nosso último encontro?
Não sei...
Continuei meu caminho de volta
Dois dias depois ouço o roncar de aviões,
pareciam desesperados.
Sobrevoavam a serra.
Bombeiros, brigadistas, biólogos,
ecologistas, gente do povo,
veterinários, donas de casa
juntaram esforços para debelar os vários focos incendiários
A serra se foi
O cerrado morreu
Secaram vários veios d'água.
E perder meu amor mais uma vez
Fez-me secar também.
11/09/2017
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