(Delicadezas em tempos de Coronavírus - XXXI)
Teresa havia se apaixonado outra vez.
Desde que fora contratada como motorista terceirizada junto à secretaria de turismo na prefeitura de sua cidade vivia fazendo viagens com assessores da mesma. Foi então que conheceu Pedro. Era um homem com seus sessenta anos, charmoso, divertido e muito inteligente. Quando soube que era divorciado, deu asas à sua imaginação embora ficasse muito tímida perto dele. Fazia seu trabalho com respeito e eficiência. Acabou ficando como motorista exclusiva da referida secretaria.
Em junho daquele ano fora convidada para levá-los numa viagem à cidade de Santo Antônio do Itambé. Imediatamente respondera com um sim e com o desejo de que ele fosse também. E ele foi. Alguns convidados, não integrantes da secretaria, também foram e viajariam em veículos próprios. Um total de doze pessoas em três carros.
Viajaram na quinta-feira, finalzinho de tarde. Aqueles caminhos eram novos para Teresa que há muito gostaria de passar por eles uma vez tratar-se de uma extensa região de ecoturismo. Teresa sempre fora amante da natureza, mais ainda pelas cachoeiras.
Pois bem, lá se foi nossa moça apaixonada com seu príncipe encantado nada novo. Ela ao volante, ele ao lado. Dois olhos foram poucos pra tanta beleza aos arredores das estradas. A Serra do Espinhaço se estende por todo o leste de Minas Gerais, do centro do estado chegando até a Bahia, cobrindo toda o Vale do Jequitinhonha.
Um jantar esperava o grupo. Tudo arranjado pelo secretário que já havia feito aquela viagem outras vezes. Frango ao molho pardo, angu, feijão e arroz foram apresentados em suas panelas de pedra sobre um enorme fogão a lenha na cozinha da anfitriã daquela primeira noite.
Depois cada um que teve a noite livre, mas com a orientação para que dormissem bem e acordassem dispostos. Na manhã seguinte, haveria um café reforçado e a subida ao Pico do Itambé que iniciaria às sete horas. Teresa, após ser liberada de seu trabalho, quis dar uma volta pela praça, afinal era noite de 13 de junho e a comunidade fazia festa para seu padroeiro.
Entrou na pequena matriz, procurou um banco e sentou-se. Olhou bem nos olhos de Santo Antônio e pediu proteção para aquela paixão que a arrebatara. Não gostou do silêncio do santo. Aquilo seria mau agouro? Pensava assim enquanto um homem bêbado, falante e sorridente aproximou-se dela. Estava vestido com extravagância, gestos amplos, hálito etílico e muito amistoso. Aquele homem lhe daria sorte, concluiu ela. Então Teresa sorriu de volta. Logo saiu dali.
Em junho daquele ano fora convidada para levá-los numa viagem à cidade de Santo Antônio do Itambé. Imediatamente respondera com um sim e com o desejo de que ele fosse também. E ele foi. Alguns convidados, não integrantes da secretaria, também foram e viajariam em veículos próprios. Um total de doze pessoas em três carros.
Viajaram na quinta-feira, finalzinho de tarde. Aqueles caminhos eram novos para Teresa que há muito gostaria de passar por eles uma vez tratar-se de uma extensa região de ecoturismo. Teresa sempre fora amante da natureza, mais ainda pelas cachoeiras.
Pois bem, lá se foi nossa moça apaixonada com seu príncipe encantado nada novo. Ela ao volante, ele ao lado. Dois olhos foram poucos pra tanta beleza aos arredores das estradas. A Serra do Espinhaço se estende por todo o leste de Minas Gerais, do centro do estado chegando até a Bahia, cobrindo toda o Vale do Jequitinhonha.
Um jantar esperava o grupo. Tudo arranjado pelo secretário que já havia feito aquela viagem outras vezes. Frango ao molho pardo, angu, feijão e arroz foram apresentados em suas panelas de pedra sobre um enorme fogão a lenha na cozinha da anfitriã daquela primeira noite.
Depois cada um que teve a noite livre, mas com a orientação para que dormissem bem e acordassem dispostos. Na manhã seguinte, haveria um café reforçado e a subida ao Pico do Itambé que iniciaria às sete horas. Teresa, após ser liberada de seu trabalho, quis dar uma volta pela praça, afinal era noite de 13 de junho e a comunidade fazia festa para seu padroeiro.
Entrou na pequena matriz, procurou um banco e sentou-se. Olhou bem nos olhos de Santo Antônio e pediu proteção para aquela paixão que a arrebatara. Não gostou do silêncio do santo. Aquilo seria mau agouro? Pensava assim enquanto um homem bêbado, falante e sorridente aproximou-se dela. Estava vestido com extravagância, gestos amplos, hálito etílico e muito amistoso. Aquele homem lhe daria sorte, concluiu ela. Então Teresa sorriu de volta. Logo saiu dali.
Vencida pelo cansaço caminhou de volta ao pequeno hotel e deitou. No meio da noite acordou e não conseguiu conciliar o sono novamente. Levantou, saiu do quarto e caminhou lento pelo corredor cheio de portas. Sabia qual era o número do quarto dele. Bateu e chamou-se baixinho pelo nome. Ele abriu a porta, deixou-a entrar e se rendeu ao pedido dela. Teresa caminhou até a cama estreita e deitou ao lado dele.
Todos muito bem dispostos na manhã seguinte. O sorriso de Teresa foi revelador. Mas, se alguém viu ou ouviu, nada comentou. Estava na mesa um café com muitas quitandas, queijos e leite fresco. O guia aguardava do lado de fora, no meio da ladeira. Mochilas nas costas, muita água e frutas, calçados adequados, roupas leves. A caminhada até o início da trilha estava apenas começando. O grupo era heterogêneo nas idades. Jovens e não tão jovens. Uns dando mãos aos outros em trechos de erosão ou subidas pedregosas. Teresa logo sentiu-se exausta. Mas não queria fazer feio.
Ainda no pé da serra muitos bois e vacas obstruíam a passagem.
- “É um fazendeiro que se negou a sair daqui quando a região se tornou Parque Estadual do Pico do Itambé. Ele mora sozinho com o filho.” Informou o guia.
Pai e filho não aceitaram o “bom dia” da turma. Teresa observou que ambos estavam muito envelhecidos e parecia que um era a sombra do outro. Guardou essa imagem na sua cabeça.
Atravessada a propriedade privada o grupo continuou a subida. Num descampado pararam para descansar, tomar água e fazer um breve lanche. Já passava do meio dia quando retomaram a andança. Por volta das treze horas as mulheres começaram a pedir arrego. Ainda estavam na metade do morro. Teresa aliou-se aos desistentes. E Pedro não se intimidou em se unir aos desertores da escalada.
Apenas quatro homens continuaram a trilha. Disseram que não perderiam a lua cheia no ponto mais alto do Pico. Entre eles um médico ortopedista, esposo de uma das assessoras, falou ao grupo da importância de um cajado funcionando como um terceiro joelho vicariante, principalmente na descida. Teresa nunca mais esqueceria de levar seu cajado nas caminhadas futuras.
Na volta, o grupo desistente foi surpreendido por um casal de jovens de aparência escandinava que, com suas longas pernas brancas, musculosas e magras, davam enormes passadas. Disseram, com gestos e poucas palavras em português, que estavam atrasados pois a lua cheia nasceria em poucas horas. Levavam barracas e demais utensílios para dormiriam lá em cima.
“Eles não tem medo dos animais silvestres nem do frio”, pensou Teresa.
Todos muito bem dispostos na manhã seguinte. O sorriso de Teresa foi revelador. Mas, se alguém viu ou ouviu, nada comentou. Estava na mesa um café com muitas quitandas, queijos e leite fresco. O guia aguardava do lado de fora, no meio da ladeira. Mochilas nas costas, muita água e frutas, calçados adequados, roupas leves. A caminhada até o início da trilha estava apenas começando. O grupo era heterogêneo nas idades. Jovens e não tão jovens. Uns dando mãos aos outros em trechos de erosão ou subidas pedregosas. Teresa logo sentiu-se exausta. Mas não queria fazer feio.
Ainda no pé da serra muitos bois e vacas obstruíam a passagem.
- “É um fazendeiro que se negou a sair daqui quando a região se tornou Parque Estadual do Pico do Itambé. Ele mora sozinho com o filho.” Informou o guia.
Pai e filho não aceitaram o “bom dia” da turma. Teresa observou que ambos estavam muito envelhecidos e parecia que um era a sombra do outro. Guardou essa imagem na sua cabeça.
Atravessada a propriedade privada o grupo continuou a subida. Num descampado pararam para descansar, tomar água e fazer um breve lanche. Já passava do meio dia quando retomaram a andança. Por volta das treze horas as mulheres começaram a pedir arrego. Ainda estavam na metade do morro. Teresa aliou-se aos desistentes. E Pedro não se intimidou em se unir aos desertores da escalada.
Apenas quatro homens continuaram a trilha. Disseram que não perderiam a lua cheia no ponto mais alto do Pico. Entre eles um médico ortopedista, esposo de uma das assessoras, falou ao grupo da importância de um cajado funcionando como um terceiro joelho vicariante, principalmente na descida. Teresa nunca mais esqueceria de levar seu cajado nas caminhadas futuras.
Na volta, o grupo desistente foi surpreendido por um casal de jovens de aparência escandinava que, com suas longas pernas brancas, musculosas e magras, davam enormes passadas. Disseram, com gestos e poucas palavras em português, que estavam atrasados pois a lua cheia nasceria em poucas horas. Levavam barracas e demais utensílios para dormiriam lá em cima.
“Eles não tem medo dos animais silvestres nem do frio”, pensou Teresa.
Após o banho e um descanso, alguns do grupo desceram a ladeira e se misturaram aos demais visitantes e moradores da pequenina cidade. Havia uma feirinha. Teresa encantou-se com os trabalhos manuais feitos pelas mulheres de lá. Chamou-lhe atenção os coloridos exuberantes dos bordados. Lembrou do homem na igreja na noite anterior. Riu sozinha.
No dia seguinte, domingo, um requintado almoço num restaurante rústico, regado com deliciosos sucos de frutas locais. Um breve descanso e a volta para a cidade de origem.
Ainda hoje, quando Teresa se lembra daquela viagem, não consegue colocar os fatos e os sentimentos em ordem. Tal desordem lhe foi acometida por aquela paixão. Entretanto alguns fatos acontecidos marcaram-na de forma deliciosa.
Mas agora uma outra paixão lhe trouxe o desejo de voltar lá. Estudante de letras e amante da literatura brasileira, conheceu a obra do cidadão e poeta, Adão Ventura, nascido ali, em Santo Antônio do Itambé, com seus versos traduzindo as dores pela cor da sua pele negra, por seu nascimento negro, por sua história negra, e por sua morte negra.
Lembrou de um de seus poemas:
Das biografias
em negro
teceram-me a pele.
enormes correntes
amarram-me ao tronco
de uma Nova África.
carrego comigo
a sombra de longos muros
tentando impedir
que meus pés
cheguem ao final
dos caminhos.
mas o meu sangue
está cada vez mais forte,
tão forte quanto as imensas pedras
que os meus avós carregaram
para edificar os palácios dos reis.
E Teresa já começou os arranjos para sua viagem.
Obviamente que não irá sozinha.
31/10/2020
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