quinta-feira, 11 de março de 2021

O Córrego do Inferno - Lenda

(Delicadezas em Tempos de Coronavírus - XXXIX)





No caminho para a Fazenda São José do Porto, em Brás Pires (MG) havia um trecho onde a mata era fechada, as árvores altas e os cipós, entrelaçavam tudo, tornando impossível adentrar por ali. Só se ouvia o som de uma queda d´água escondida no meio de tudo. O trecho era longo e, de uma curva acentuada numa descida, dava-se com o Córrego do Inferno.

Era ali que o demo aparecia nas noites escuras de lua nova. Soltava fumaça pelas ventas e seus olhos faiscavam labaredas de fogo e sangue. Deixava no ar um cheiro podre de enxofre e um hálito etílico. Ninguém se arriscava passar ali naquela luas. Tentaram mudar o nome do riacho para Córrego da Glória, para tentar exorcizar o coisa ruim. Mas o diabo enfeitiçou os passantes que continuavam a chama-lo de Córrego do Inferno. 

Quem quiser ver o desconjuro é só ir lá na lua nova. Eu já me arrisquei. Fui lá. Queria ver bem de perto quem era o tal safado que aparecia nas noites sem luar. Jamais contei o que eu vi por lá. Mas conto que um primo, danado de matreiro, ganhou o apelido de Zé Capeta. Todos diziam que ele, quando morresse iria direto para o limbo e para os infernos pois teria que pagar por seus pecados. Pois bem, agora que ele morreu, voltou a amedrontar os cavaleiros e senhoras que passam pelo Córrego do Inferno.

Aviso que, quem for lá, deve levar uma garrafa de pinga, da boa. Ele vai adorar a visitinha e a cachaça.

28/03/2021

Fotografia: cachoeira no meio da mata no alto da Serra da Mantiqueira - Aiuruoca (MG) - Arquivo pessoal

Observação: 
Esta historieta foi escrita em resposta à questão colocada na quarta Oficina de Escrita de fevereiro de 2021, pelo mestre e poeta Ronald Claver: "Você tem medo de assombração?"

Consideração do mestre:

A história da assombração é fantástica, tão simples, mas gostosa de fazer medo até no capeta. Ah, o capeta, hoje os capetas vivem de terno e gravata e dão uma banana, poderia ser uma vela, para o povo que o elegeu. A escrita é leve, um contar sem fim, é como estivéssemos em uma roda, comendo broa e tomando café e ouvindo a avó contando coisas do demo. E a gente morrendo de medo. E escrever é também isto, facilitar, sem se tornar pequeno, as pequenas coisas. Parabéns, bjs

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