Uma blusa para ela
Ela conhecia
o querer dela. Queria uma blusa nova. Sabia qual tecido escolheria: algodão.
Sempre gostara da textura do algodão junto ao seu corpo. O tergal chegou e
agradou a todos pela praticidade da lavagem, por não necessitar do trabalho
odioso de passar, pelo fato de não amarrotar e pelo custo inferior ao algodão.
Ela bem que tentou usá-lo.
Ainda se lembra das calças pantalonas nas cores vinho e preto do tal tecido americano. Não gostou. Ele era quente, feio e as cores pareciam desbotadas.
Ainda se lembra das calças pantalonas nas cores vinho e preto do tal tecido americano. Não gostou. Ele era quente, feio e as cores pareciam desbotadas.
Sua mãe
gostava de costurar. Tinha uma máquina de costuras, ainda de pedal. Um presente
do pai de Lucinha. Fazia pequenos remendos e, de vez em quando, uma roupa nova para
os filhos menores. A menina ao lado, sempre observando. Adorava tocar o pedal e
se orgulhava do controle no ritmo dos pés e das mãos com o tecido em direção a
agulha.
Não passara despercebido à mãe o interesse daquela filha em aprender o ofício. Tratara logo de colocar as duas filhas mais novas numa aula de corte e costura.
Lucinha adorou as tais aulas que eram dadas por uma tia muito elegante e que sabia das coisas.
Não passara despercebido à mãe o interesse daquela filha em aprender o ofício. Tratara logo de colocar as duas filhas mais novas numa aula de corte e costura.
Lucinha adorou as tais aulas que eram dadas por uma tia muito elegante e que sabia das coisas.
-“Aquela é a estrela Dalva, o planeta Vênus. Aquela é a constelação de Câncer. Veja lá o Cruzeiro do sul. Olha a constelação de Escorpião. As nebulosas”.
Lucinha ficou encantada. Jamais vira o céu tão de perto. Ficou pensando no tanto que sua tia chique conhecia dos astros do céu. Nunca mais deixou de contemplar as noites, aprendera as fases da lua, os nomes das constelações, os planetas, a importância da lua nas marés e pescarias, nas viagens marítimas e muito mais.
Em casa, sempre tiveram a folhinha “Mariana” e ela lia e relia tudo que havia escrito nela, desde receitas de bolos, santos do dia, épocas boas para plantio e colheita de um ou outro produto agrícola e tantas outras novidades.
Quanto mais a sobrinha se interessava pela costura e pelas historias do céu, mais a tia gostava de contar sobre o espaço e seus astros. A danada da menina aprendia com muita facilidade, gostava de saber de tudo que a tia ensinava, até de ler os livros que a tia emprestava.
A tia era de uma cidade do interior de São Paulo e, sempre que ia lá visitar os parentes, voltava com muitas histórias da viagem. E a sobrinha ouvia tudo atentamente.
Mas
a mãe adoecera e Lucinha abandonara a costura e as estrelas para ajudar nos
afazeres da casa. Entretanto, alguns aprendizados da costura, ela nunca
esquecera, como a leveza dos tecidos, o caimento de cada um deles e a agradável
sensação na pele em usar este ou aquele tecido ou modelo. Aprendera a
importância de sentir-se bem dentro de uma roupa e que a elegância passava pelo
conforto de uma roupa bem talhada.
A
menina, então com seus quase quinze anos, queria uma blusa. Não seria uma blusa
qualquer. Pela primeira vez ela escolhera tudo; o algodão, as cores, uma
costureira muito especial para uma ocasião também muito especial.
O tecido era uma bandagem, nome dado por ser parecido com as ataduras e as fraldas daquela época, mas isto não era tão importante. O que contava era o prazer da escolha. Ela vira tal retalho do tecido numa banca em oferta por uma bagatela. O dinheiro era das aulas particulares de matemática que ela deu para as irmãs gêmeas. As duas foram aprovadas e os pais, satisfeitos, pagaram prá mais.
Tecido escolhido, comprado e pago, lá fora ela escolher o feitio. Uma blusa de mangas compridas, afinal naquela cidade sempre fazia frio. Teria botões azuis para combinar com o azul das estampas. A costureira seria a vizinha que também aprendera a costurar e aceitou a encomenda.
Apesar de sua tão pouca idade, Lucinha já tinha um corpo pronto. Os cabelos e os olhos eram castanho claro. Era uma menina muito bonita. Estava apaixonada pela primeira vez.
O goleiro do time de futebol do bairro lhe encantou.
O tecido era uma bandagem, nome dado por ser parecido com as ataduras e as fraldas daquela época, mas isto não era tão importante. O que contava era o prazer da escolha. Ela vira tal retalho do tecido numa banca em oferta por uma bagatela. O dinheiro era das aulas particulares de matemática que ela deu para as irmãs gêmeas. As duas foram aprovadas e os pais, satisfeitos, pagaram prá mais.
Tecido escolhido, comprado e pago, lá fora ela escolher o feitio. Uma blusa de mangas compridas, afinal naquela cidade sempre fazia frio. Teria botões azuis para combinar com o azul das estampas. A costureira seria a vizinha que também aprendera a costurar e aceitou a encomenda.
Apesar de sua tão pouca idade, Lucinha já tinha um corpo pronto. Os cabelos e os olhos eram castanho claro. Era uma menina muito bonita. Estava apaixonada pela primeira vez.
O goleiro do time de futebol do bairro lhe encantou.
Haveria
uma festa na rua e, aquela blusa, ela usaria para ser vista por ele. Ficara
ainda mais bonita dentro de suas escolhas. O tecido era suave e suave era ela
vestida com aquela blusa. Antes
fora à igreja com a mãe, condição para ir à festa.
Um vizinho não entendia a recusa do seu pedido
de namoro. Todos diziam do tanto que ele era apaixonado por ela. Saberia depois
que ser amada, às vezes, poderia ser tão difícil quanto amar uma pessoa.
Naquela noite ela estava esplendorosa nos tons azuis. Mas o seu escolhido não aparecera na festa. Seus olhos, agora, escureceram de tristeza. Era um gostar demais e Lucinha ainda nada entendia de amor.
Ele não a viu com aquela blusa tão dela.
Voltara para casa antes da hora marcada pelo pai.
Durante toda aquela longa noite mal dormida, olhava
as estrelas com seus nomes e sonhava acordada. Imaginou que ele poderia ter
sabido daquela blusa tão bonita, afinal a costureira era uma de suas irmãs.
Mas ele teria vista uma blusa qualquer, desvestida dela.
Então
seu coração apertou no peito e ela chorou de amor.
Janeiro
de 2014
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