CONFIDÊNCIAS
Alguns dias atrás
uma amiga me procurou. Queria falar comigo acerca de uma conversa que tivera
com um colega de profissão durante um café no local de trabalho dos dois. Eles já
se conheciam há mais de 30 anos e nunca foram amigos, embora assim ela o
tratasse. Eram bons colegas de trabalho. Às vezes pensava que falava mais dela
do que ele desejava escutar, disse-me ela. Mas ele, com toda sua elegância,
escutava.
Bem, no dia
da tal conversa e, como sempre, falaram sobre o trabalho, sobre viagens, sobre
politica, sobre os filhos. Neste momento, ela não resistindo, falara-lhe também
do romance que estava vivendo naqueles tempos. Era um amor acontecido na
juventude que reaparecera e a tomara com o mesmo colorido da época. Falara para
ele acerca daquele sentimento que a abduzira para além de qualquer
racionalidade, como todo amor, ainda mais sendo esse, um amor ressurgindo da adolescência.
Beatriz me
segredou que não conseguia controlar as palavras para falar do homem que a
deixava fora de si. Estava muito alegre, exuberante, acreditando no
renascimento daquele amor tão significativo para ela. Foi então que o tal
colega fizera um comentário sobre ela e sua paixão recorrente. Dissera poucas
palavras, fora doce e cruel, contara-me ela. Feriu-a no ponto. Emudecida ela
permaneceu. Entretanto não conseguira lembrar quais palavras foram ditas por
aquele seu amigo. Desde então vem buscando respostas para as várias perguntas
que já se acumulavam em sua cabeça.
Eu não sabia
o que dizer para minha amiga. Temia por minhas palavras. Apenas fiquei ao lado, escutando.
O que seu amigo teria dito de desastroso? Sabia
que ele acompanhara sua vida, seus casamentos, a chegada dos filhos, as
dificuldades financeiras, as sobrecargas de trabalho, suas alegrias. Afinal
trabalhavam juntos há muitos anos. Assim ela também sabia e esteve do lado dele
em seus tempos difíceis.
Ele era um belo homem, muito charmoso, tinha garantido
seu poder de sedução e usufruía dele; sabia que era desejado pelas mulheres. Mas
para ela, seu amigo nunca fora mais do que um antigo e bom colega de trabalho.
Por outro lado, minha amiga sempre fora uma bela mulher, atraente, inteligente,
bem sucedida na profissão, boa amiga e querida por todos.
-"O que ele
dissera? Quais palavras foram ditas? E porque o que ele dissera causara tanta dor?”
Beatriz não
conseguia respostas nem esquecer aquilo que não lembrava.
No avançado
daquela hora de nossa conversa, num bar da cidade, nos despedimos. Ela continuava
mais que apreensiva, continuava tristonha. Certamente, para ela, amanhã não seria
outro dia...
Fiquei
pensando em Beatriz e sua alma. Não conseguia entende-la. Considerava-a uma
mulher destemida, corajosa e ousada. Entretanto, agora, me parecia muito frágil.
Soube que ela se recolhera com sua dor. Era um tempo preciso.
Uma vez ,
quando em situações opostas, eu chorava um amor perdido, ela me dissera que eu
não deveria poupar lágrimas, que eu deveria me permitir cair no chão, perder
noites de sono e não me poupasse do sofrimento.
“É só no
fundo do buraco que encontramos chão para nos impulsionarmos e voltarmos à
vida”, dissera-me ela.
As semanas
passaram e o sorriso voltou a se instalar no rosto de Beatriz. Um sorriso
diferente. Reassumiu seus trabalhos com a mesma garra, competência e
disciplina.
Aquele homem
que lhe trouxera tantas recordações já não aparecia mais. Ela ainda agarrava à
esperança de outros reencontros sempre que ele enviava mensagens carinhosas.
Ela estava, mais uma vez, apaixonada.
Às vezes eu a
convidava para sair, ir ao cinema, ao teatro, ao bar de um amigo comum. Ela
respondia que estava cansada pelo trabalho estressante. Até que um dia nos
encontramos e a percebi recolhida, distante, calada.
Beatriz me
revelou que não conseguia deixar de pensar no que ouvira seu colega dizer.
Entretanto percebera que, já não se importava com o que ele teria dito. O que
tanto lhe angustiara era o que ela escutara naquilo que o colega dissera. A
verdade nua. Então se lembrara de uma frase lida em seus estudos naqueles dias:
“nada é mais temível do que dizer algo que possa ser verdadeiro”
17/02/2014
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