terça-feira, 5 de agosto de 2014

CONFIDÊNCIAS



                                    CONFIDÊNCIAS

  Alguns dias atrás uma amiga me procurou. Queria falar comigo acerca de uma conversa que tivera com um colega de profissão durante um café no local de trabalho dos dois. Eles já se conheciam há mais de 30 anos e nunca foram amigos, embora assim ela o tratasse. Eram bons colegas de trabalho. Às vezes pensava que falava mais dela do que ele desejava escutar, disse-me ela. Mas ele, com toda sua elegância, escutava.
  
  Bem, no dia da tal conversa e, como sempre, falaram sobre o trabalho, sobre viagens, sobre politica, sobre os filhos. Neste momento, ela não resistindo, falara-lhe também do romance que estava vivendo naqueles tempos. Era um amor acontecido na juventude que reaparecera e a tomara com o mesmo colorido da época. Falara para ele acerca daquele sentimento que a abduzira para além de qualquer racionalidade, como todo amor, ainda mais sendo esse, um amor ressurgindo da adolescência.

  Beatriz me segredou que não conseguia controlar as palavras para falar do homem que a deixava fora de si. Estava muito alegre, exuberante, acreditando no renascimento daquele amor tão significativo para ela. Foi então que o tal colega fizera um comentário sobre ela e sua paixão recorrente. Dissera poucas palavras, fora doce e cruel, contara-me ela. Feriu-a no ponto. Emudecida ela permaneceu. Entretanto não conseguira lembrar quais palavras foram ditas por aquele seu amigo. Desde então vem buscando respostas para as várias perguntas que já se acumulavam em sua cabeça.

  Eu não sabia o que dizer para minha amiga. Temia por minhas palavras. Apenas fiquei ao lado, escutando.

  O que seu amigo teria dito de desastroso? Sabia que ele acompanhara sua vida, seus casamentos, a chegada dos filhos, as dificuldades financeiras, as sobrecargas de trabalho, suas alegrias. Afinal trabalhavam juntos há muitos anos. Assim ela também sabia e esteve do lado dele em seus tempos difíceis.

  Ele era um belo homem, muito charmoso, tinha garantido seu poder de sedução e usufruía dele; sabia que era desejado pelas mulheres. Mas para ela, seu amigo nunca fora mais do que um antigo e bom colega de trabalho. Por outro lado, minha amiga sempre fora uma bela mulher, atraente, inteligente, bem sucedida na profissão, boa amiga e querida por todos.

 -"O que ele dissera? Quais palavras foram ditas? E porque o que ele dissera causara tanta dor?”

  Beatriz não conseguia respostas nem esquecer aquilo que não lembrava.

 No avançado daquela hora de nossa conversa, num bar da cidade, nos despedimos. Ela continuava mais que apreensiva, continuava tristonha. Certamente, para ela, amanhã não seria outro dia...
Fiquei pensando em Beatriz e sua alma. Não conseguia entende-la. Considerava-a uma mulher destemida, corajosa e ousada. Entretanto, agora, me parecia muito frágil. Soube que ela se recolhera com sua dor. Era um tempo preciso.

  Uma vez , quando em situações opostas, eu chorava um amor perdido, ela me dissera que eu não deveria poupar lágrimas, que eu deveria me permitir cair no chão, perder noites de sono e não me poupasse do sofrimento.

  “É só no fundo do buraco que encontramos chão para nos impulsionarmos e voltarmos à vida”, dissera-me ela.

  As semanas passaram e o sorriso voltou a se instalar no rosto de Beatriz. Um sorriso diferente. Reassumiu seus trabalhos com a mesma garra, competência e disciplina.
Aquele homem que lhe trouxera tantas recordações já não aparecia mais. Ela ainda agarrava à esperança de outros reencontros sempre que ele enviava mensagens carinhosas. Ela estava, mais uma vez, apaixonada.

  Às vezes eu a convidava para sair, ir ao cinema, ao teatro, ao bar de um amigo comum. Ela respondia que estava cansada pelo trabalho estressante. Até que um dia nos encontramos e a percebi recolhida, distante, calada.

  Beatriz me revelou que não conseguia deixar de pensar no que ouvira seu colega dizer. Entretanto percebera que, já não se importava com o que ele teria dito. O que tanto lhe angustiara era o que ela escutara naquilo que o colega dissera. A verdade nua. Então se lembrara de uma frase lida em seus estudos naqueles dias: “nada é mais temível do que dizer algo que possa ser verdadeiro”



17/02/2014

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