segunda-feira, 15 de junho de 2020

História do mês de Junho

  (Delicadezas em Tempos de Coronavírus XV)                   



Os tempos estavam desencontrados. Era junho e o frio não chegara. O sol continuava brilhante, quente e desinteressado pelo inverno prometido. As flores, ignorando a presença do outono, coloriam o quintal. Eram flores de antúrios, grandes e pequeninas, flores de alamandas, algumas teimosas flores do jasmim manga, sofridas flores de spatifilus, mimosas meio-dia, flores de hibisco (que por ali são chamadas de nariz-de-seu-pai) e buganvílias. Catarina não se cansava de festejar as flores adversas aos tempos delas. Enquanto ficava a admirá-las pensava no seu amor.

Só ele ainda não apareceu. Será que desentendeu com São Pedro? Será que, exibido feito ele só, pulou outra fogueira e se queimou? “Mas as fogueiras ainda não estão subindo aos céus e hoje é dia de Santo Antônio”, resignou-se.

Enquanto isto os olhos de moça continuavam refletindo as cores das flores e viajavam com a esperança que ele chegasse antes da noite de São João. Ele sempre veio. Ao pensar assim o coração bateu aliviado. Era só esperar. Seria apenas uma questão de dias e ele apareceria.

Catarina esperou. Quisera que as horas voassem no relógio da parede da sala e o namorado, como que vindo do nada, aparecesse.

Na carta recebida ele confirmara a data de sua chegada. Ela trançou os cabelos, pintou as unhas, botou o vestido novo. “Será que ele vai reparar?” Era ela e sua impaciência.

Chegado o dia esperado as batidas do coração de Catarina aceleraram no mais não poder. Ficou na janela. A namoradeira dos cotovelos marcados com a pele comprimida.

Ele desceu a rua. Era todo calmo e charme. Cumprimentou-a com os devidos respeitos de seu jeito. Tentou sorrir. O riso saiu amarelo. Pediu a Catarina que chamasse o pai e a mãe. Ela abaixou a cabeça e obedeceu.

Os pais entraram na sala e o jovem, sem meias palavras, foi logo dizendo. Havia noivado outra moça. Estava de casamento marcado. Sem pedir desculpas apenas esperou o que viesse do lado de lá. O pai, ainda sem dizer palavras, abriu a porta e encaminhou para a rua o que noivo da outra que não era sua filha. Ele não valia palavra alguma. Só Catarina e seu coração queimado de amor não vira a verdade dos fatos.

Depois disto a mãe quis conversar. Mas Catarina não tinha ouvidos naquela hora. Era toda lágrimas e dores. Entrou para seu quarto e por lá ficou emudecida. Os pais alarmaram. As amigas foram chamadas para dar conselhos e alegrá-la. Nada. Catarina nem tinha mais olhos floridos.

Porém na noite de São João ela saiu do quarto com seu vestido mais bonito. Tinha os cabelos soltos e os olhos brilhantes. Foi para a festa e dançou a quadrilha. No final da dança seu par lhe convidou para uma conversa. Quiçá um namorico. Ela, alvoroçada, aceitou o convite.

Contam, aqueles que viram o acontecido, que Catarina naquela noite dançou toda a noite em torno da fogueira até virar uma língua de fogo e subir aos céus. O moço pegou seu alazão e, entre as estrelas, campeou atrás dela.

No dia seguinte, para espanto de todos, as flores alaranjadas das buganvílias do quintal da casa de Catarina amanheceram entrelaçadas com os galhos do frondoso ipê.

Catarina e o moço nunca mais foram vistos. Até hoje a ciência dos homens e das plantas buscam explicações para aqueles mistérios.

E, por todos os anos em junho, essa história é contada pelo povo daquela região.



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